DA RAZÃO
O “espaço público falta cruelmente em Portugal”, escreveu o filósofo José Gil,
em 'Portugal Hoje - O Medo de Existir'. 20 anos volvidos, a mitomania,
pós-verdade, manipulação e fulanização, carreiam, diariamente, para o espaço
público, também através da comunicação social, a toxicidade do mundo a «preto e
branco». Este movimento de “erosão da democracia”, que compromete o serviço
público da comunicação social, com e em reflexo dos vários níveis de governação,
transforma o lugar de debate no clube de combate. Também os Açores não podem
abdicar da exigência democrática do uso público da razão argumentativa. Nós, e
as nossas comunidades, devemos tomar consciência e monitorizar o espaço público
na sua função política, social, cultural, e, sobretudo, ajudar os profissionais,
e respetivas organizações, a uma ação responsável e consequente, além do mero
fluxo de produção e troca de informações. Por isso torno à “Ágora”, assumindo um
espaço de reflexão, partilha e desafio que, quinzenalmente, deixarei ao vosso
cuidado. Não é uma inevitabilidade regional que as pessoas pensem sempre
sozinhas.
ESPAÇO PÚBLICO, no Açoriano Oriental
sexta-feira, julho 27, 2012
UMA ÓPERA BUFA
A mistificação
mediática com que o PSD/Açores tem tratado uma matéria fundamental para o nosso
futuro, como os transportes aéreos e marítimos, na impossibilidade pública de
uma justa qualificação política, remete-me para o campo das artes cénicas.
Berta Cabral é líder do PSD/Açores desde Janeiro de 2009. No seu longuíssimo
currículo, de 30 anos em funções políticas, destacam-se, para o que aqui nos
releva, o cargo de Directora Regional dos Transportes, de Presidente do
Conselho de Administração da SATA e de Secretária Regional das Finanças. Do
período, em que teve responsabilidades directas, ou que pôde influir
decisivamente, na evolução do sector, o que nos ficou dos transportes marítimos
foi a sua extinção, e dos transportes aéreos a sua pré-insolvência, temperada,
anualmente, com aumentos das tarifas na ordem dos 10%.
Entre longos
silêncios, como que à espera de uma luz do Divino, o PSD/Açores sob a sua
liderança mascara o pesado legado e decide, num errático argumento, cavalgar
todos os descontentamentos e demagogias da praça pública, chegando ao cúmulo
de, no espaço de poucos meses, fazer juras a Deus e ao Diabo.
Começaram nas
Low Cost. A 6 de Janeiro de 2010, afirmava Berta Cabral “É preciso deixar que
as ilhas que têm condições para receber companhias low-cost as possam receber e
potenciar através disso o turismo dessas ilhas”.
Já a 17 Outubro
2011, questionada sobre se o seu modelo aponta para a manutenção das cinco
portas de entrada tergiversa “Essa questão tem de ser bem estudada no seu
conjunto, não vou estar aqui a dar opiniões avulsas sobre cinco, sobre três
sobre quatro. Pode fazer todo o sentido e até pode ser que se façam opções
diferentes.” Inacreditável!
Depois nunca
mais parou! A 13 de Janeiro do corrente, afirma ter proposto ao presidente da
Comissão Europeia, Durão Barroso, a criação de um programa POSEI para os
transportes que permita reduzir o preço das passagens aéreas “uma ideia
inovadora”, afirmou Berta Cabral, como se não fosse público que o Governo dos
Açores vem trabalhando formal e politicamente a mesma ideia, desde 2010, junto
das RUP e das instituições europeias.
A 15 de
Fevereiro, ajusta a mira e “temos de acertar as nossas estratégias em função
das novas realidades e mais do que low-cost, os Açores precisam de tarifas mais
baratas” mas, reafirmando a necessidade do POSEI para os transportes, já diz
que “vai ser um caminho longo e duro”.
A 13 de Março,
na apresentação da candidatura já “é uma prioridade absoluta um modelo
agilizado que defenda os passageiros, residentes e não residentes, por via da
fixação de uma tarifa de teto máximo”.
A 15 de Abril, em
pleno discurso de encerramento do congresso partidário, garante que “1% do
orçamento regional será alocado ao abaixamento das passagens”. 12Milhões a
menos para o Governo da República de Passos Coelho!
Mas, três dias
depois, a 18 de Abril, quando perguntada se realmente pode concretizar essa
promessa, já tem menos certezas “isso vai decorrer das negociações e da
possibilidade dos fundos disponíveis para esse efeito. Eu neste momento
preferiria não estar a apontar um número porque se apontar agora pode ser muito
ou pode ser pouco”.
A 16 de Maio,
afirma peremptoriamente que a proposta do Governo Regional para alterar as
obrigações de serviço público nas ligações aéreas entre os Açores e o
continente, com tarifas a menos 40%, “não merece confiança e engana os
açorianos”.
A 21 de Junho, o
POSEI Transportes volta a ser “um desígnio” e a 29 Junho é "urgente criar
condições do ponto de vista legal para permitir a operação de aviões
cargueiros”, como se a proposta do Governo dos Açores entregue em Lisboa não
resolvesse essa questão.
A 10 de Julho,
“os aeroportos dos Açores têm de fazer parte do pacote de privatização” da ANA,
que “deve garantir os seus custos de funcionamento e de investimento”, mas um
ano antes, a 8 de Julho de 2011, o Grupo Parlamentar do PSD/A votou contra uma
Resolução com o mesmo teor, quiçá porque, a 9 de Maio desse ano, a sua líder se
havia comprometido “a aprofundar as competências das regiões autónomas, por
exemplo, na gestão dos aeroportos na sequência da privatização da ANA”.
Como se tal não
bastasse, no passado 11 de Julho, surge o clímax desta comédia quando, no
âmbito das conferências promovidas pelos sociais-democratas, o ex-Presidente do
Conselho de Administração da SATA, de uma penada, desmontou em directo e ao
vivo todo o argumentário que a líder do PSD/Açores andou a encenar. Pior era
impossível!
Na verdade, o
modelo apresentado não só se assemelha como assenta em todos os pressupostos
que o Governo dos Açores vem defendendo desde Agosto do ano passado junto do
Governo da República: 1) não onerar mais o erário público (Berta Cabral defende
o desvio de 12Milhões do orçamento regional); 2) flexibilizar o modelo das OSP contra
o fantasma da low cost (Berta Cabral já defendeu as low cost); 3) criar uma
tarifa especial para residente, com tecto máximo e posterior entrega do
subsídio ao passageiro, numa redução em cerca de 40% do valor actual
(exactamente o proposto pelo Governo dos Açores).
Esta lição de
sapiência a Berta Cabral e aos seus seguidores foi cruel, tal como o outro lado
do palco, aquele que interessa aos Açorianos, é demasiado sério para que
alguém, com consciência, o possa ignorar. Nesta, como noutras matérias, a falta
de memória de alguns será, sempre, avivada pela verdade.
Publicado no Diário Insular e no Jornal do Pico
sábado, setembro 18, 2010
OS UMBIGOS CONSTITUCIONAIS E AS TRÊS TRAIÇÕES DO PSD/AÇORES
Para aqueles que, como eu, defendem que todas as oportunidades são boas para rever a Constituição na parte das Autonomias, a versão final do Projecto de revisão constitucional da autoria do PSD, e respectivo percurso, só pode originar um estado de alma: Perplexidade!
Perplexidade pelo conjunto equívocos políticos, ausência de ambição autonómica e fragilidade técnica das soluções propostas e sufragadas pelo PSD/Açores.
Se quanto a esta última vertente, que não é factor de somenos pelas implicações futuras que uma redacção menos feliz pode acarretar, remeto, por humildade intelectual, para as considerações quase jocosas do Prof. Jorge Miranda (SICNotícias, dia 15 de Setembro p.p.), já as questões políticas e, especialmente, a falta de visão para a Autonomia, de um partido que se comporta como «pai» da mesma, não podem passar em claro.
Na verdade, a menos que uma cegueira «saramaguiana» assole os sociais-democratas da Região todo este processo não pode fugir a um libelo: Traição. Uma acusação que parece forte, mas que colhe conforme passo a explicar.
As revisões constitucionais na parte das autonomias têm seguido uma linha de orientação que é ponto assente por todos os políticos e estudiosos da matéria: primeiro, conseguir resolver questões constitucionais pendentes face à jurisprudência do Tribunal Constitucional (em 97 e 2004); segundo, introduzir avanços políticos na configuração das autonomias face à organização do Estado (em 82 e 89).
Ora, como é público, desde 2004 (ano da última revisão constitucional) várias controvérsias constitucionais foram sendo elencadas, em especial, nos últimos dois anos, a propósito do processo de revisão do Estatuto Político-Administrativo. É, pois, à conta deste enqadramento que descortino a primeira traição do PSD/A. A traição ao Povo Açoriano e à instituição que o representa, a Assembleia Legislativa da Região, enquanto proponente de soluções, unanimemente, votadas nos Açores mas, posteriormente, declaradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional ou vetadas politicamente por Cavaco Silva.
Ou seja, quer no Projecto anunciado, apresentado, aprovado, depois Pré-Projecto, retocado, alterado, re-aprovado, reapresentado, quer, finalmente, na versão final, por muito que nos queiram fazer esquecer, o que se regista é que, no que é subscrito pelo PSD/A, não existem soluções concretas, sequer afloramentos, para questões constitucionais como: a criação de provedores sectoriais regionais; as audições pelo Presidente da República no âmbito da dissolução da Assembleia Legislativa da Região ou da declaração de estado de sítio ou emergência; ou, ainda, para a audição qualificada pelos órgãos de soberania dos órgãos regionais.
Mais, o esforço constituinte, ou a falta dele, conduziu à demissão de soluções constitucionais, realmente, clarificadoras das competências legislativas e quanto a relações externas da Região. Omissões graves, disfarçadas com silêncios cúmplices onde valores, outros valores, se impuseram.
Mas, tudo isto até poderia surgir com menos reparo se o PSD/A se tivesse ancorado no segundo pressuposto das revisões constitucionais, fomentar novas conquistas políticas para as autonomias. Em boa verdade, com um mínimo de esforço teria sido possível represtinar um conjunto de matérias centrais de muitas das questões autonómicas do período 80-96 e quantas vezes afloradas nos arroubos autonomistas de muitos dos fiéis seguidores. Mais uma vez não o fizeram! Porque não o souberam? Porque não o quiseram? Porque não lhes foi autorizado?
Esta configura a segunda traição do PSD/A. A traição à sua História e ao seu património autonómico. Continuar a ignorar a solução constitucional dos votos dos emigrantes para a ALRAA (que a proposta do PSD/Madeira não esquece); avançar para a «peregrina» solução de um Representante da República comum para as regiões autónomas, quando nem o PSD/Madeira nem o PS/Açores defendem a continuidade dessa figura; abster-se, sequer, de procurar evitar o veto de gaveta dessa espúria figura; esquecer a criação de partidos de índole regional, encolher-se na solução para a «guerra das bandeiras», etc..., tudo se configura como demasiado infeliz.
Mas, se tudo isto já seria justificativo suficiente para este arrazoado não podemos deixar de assentar outra espantosa traição do PSD/A. A traição para com os próprios órgãos do partido.
Ao que parece, tudo terá começado na noite da eleição do líder nacional do PSD e no anúncio do grupo de trabalho para a revisão constitucional. A líder do PSD/Açores, talvez movida por um voluntarismo oportunista, foi lesta em designar o Deputado Pedro Gomes para a missão, ungido de poderes ou saberes que ainda hoje se desconhecem. Dos trabalhos do azórico representante pouco ou nada se soube, sequer se foram dados a opinar ou aprovar aos seus companheiros e dirigentes. Pior, desde a noite da apresentação, no famoso Concelho Nacional, o que a líder do PSD/A tornou público, «sem dar cavaco» aos seus, foi o franco (?) regozijo por um “excelente projecto de revisão constitucional que respeita os compromissos políticos do presidente do PSD quanto às autonomias e confirma o seu empenho no aprofundamento do processo autonómico”, excepto … na parte do Representante da República, uma «originalidade» que, pelos vistos, é bastarda de mãe e pai. E se esse famoso projecto, durante dois meses sofreu mandos e desmandos, melhorias, aperfeiçoamentos ou remendos de «arrojo» em tantos outros capítulos, a excepção tocou às autonomias. (In)acção de quem?
O que resta, pois, é um molho de dúvidas contra uma singular certeza: a de que todas e quaisquer soluções que beliscassem a interpretação constitucional de Cavaco Silva para autonomias, fossem ignoradas, omitidas, escondidas.
Assim, por método ou soberba, o PSD/A não procurou consensos com o PS/Açores, caminho natural e único para fortalecer posições e soluções junto de Lisboa. Inclusive, sequer procurou concertar objectivos com os seus congéneres da madeirenses, já que, hoje, o PSD/Madeira declara, para quem quer ouvir, apenas contar com o PS/Açores para garantir soluções constitucionais que assegurem uma evolução do processo autonómico.
Este terá sido, afinal, o PSD/A de alguns. O PSD/A que foi empurrado para as soluções de Cavaco Silva e dos dirigentes nacionais, rasgando compromissos, renegando a sua História e desrespeitando os seus órgãos. A troco de quê? Ignora-se…
Este é, afinal, um PSD/Açores cada vez mais exíguo. Exíguo nos conteúdos, nas proposituras e, necessariamente, nas lideranças. Este partido parece, infelizmente, cada vez mais PSD e cada vez menos Açores.
No Diário Insular
Perplexidade pelo conjunto equívocos políticos, ausência de ambição autonómica e fragilidade técnica das soluções propostas e sufragadas pelo PSD/Açores.
Se quanto a esta última vertente, que não é factor de somenos pelas implicações futuras que uma redacção menos feliz pode acarretar, remeto, por humildade intelectual, para as considerações quase jocosas do Prof. Jorge Miranda (SICNotícias, dia 15 de Setembro p.p.), já as questões políticas e, especialmente, a falta de visão para a Autonomia, de um partido que se comporta como «pai» da mesma, não podem passar em claro.
Na verdade, a menos que uma cegueira «saramaguiana» assole os sociais-democratas da Região todo este processo não pode fugir a um libelo: Traição. Uma acusação que parece forte, mas que colhe conforme passo a explicar.
As revisões constitucionais na parte das autonomias têm seguido uma linha de orientação que é ponto assente por todos os políticos e estudiosos da matéria: primeiro, conseguir resolver questões constitucionais pendentes face à jurisprudência do Tribunal Constitucional (em 97 e 2004); segundo, introduzir avanços políticos na configuração das autonomias face à organização do Estado (em 82 e 89).
Ora, como é público, desde 2004 (ano da última revisão constitucional) várias controvérsias constitucionais foram sendo elencadas, em especial, nos últimos dois anos, a propósito do processo de revisão do Estatuto Político-Administrativo. É, pois, à conta deste enqadramento que descortino a primeira traição do PSD/A. A traição ao Povo Açoriano e à instituição que o representa, a Assembleia Legislativa da Região, enquanto proponente de soluções, unanimemente, votadas nos Açores mas, posteriormente, declaradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional ou vetadas politicamente por Cavaco Silva.
Ou seja, quer no Projecto anunciado, apresentado, aprovado, depois Pré-Projecto, retocado, alterado, re-aprovado, reapresentado, quer, finalmente, na versão final, por muito que nos queiram fazer esquecer, o que se regista é que, no que é subscrito pelo PSD/A, não existem soluções concretas, sequer afloramentos, para questões constitucionais como: a criação de provedores sectoriais regionais; as audições pelo Presidente da República no âmbito da dissolução da Assembleia Legislativa da Região ou da declaração de estado de sítio ou emergência; ou, ainda, para a audição qualificada pelos órgãos de soberania dos órgãos regionais.
Mais, o esforço constituinte, ou a falta dele, conduziu à demissão de soluções constitucionais, realmente, clarificadoras das competências legislativas e quanto a relações externas da Região. Omissões graves, disfarçadas com silêncios cúmplices onde valores, outros valores, se impuseram.
Mas, tudo isto até poderia surgir com menos reparo se o PSD/A se tivesse ancorado no segundo pressuposto das revisões constitucionais, fomentar novas conquistas políticas para as autonomias. Em boa verdade, com um mínimo de esforço teria sido possível represtinar um conjunto de matérias centrais de muitas das questões autonómicas do período 80-96 e quantas vezes afloradas nos arroubos autonomistas de muitos dos fiéis seguidores. Mais uma vez não o fizeram! Porque não o souberam? Porque não o quiseram? Porque não lhes foi autorizado?
Esta configura a segunda traição do PSD/A. A traição à sua História e ao seu património autonómico. Continuar a ignorar a solução constitucional dos votos dos emigrantes para a ALRAA (que a proposta do PSD/Madeira não esquece); avançar para a «peregrina» solução de um Representante da República comum para as regiões autónomas, quando nem o PSD/Madeira nem o PS/Açores defendem a continuidade dessa figura; abster-se, sequer, de procurar evitar o veto de gaveta dessa espúria figura; esquecer a criação de partidos de índole regional, encolher-se na solução para a «guerra das bandeiras», etc..., tudo se configura como demasiado infeliz.
Mas, se tudo isto já seria justificativo suficiente para este arrazoado não podemos deixar de assentar outra espantosa traição do PSD/A. A traição para com os próprios órgãos do partido.
Ao que parece, tudo terá começado na noite da eleição do líder nacional do PSD e no anúncio do grupo de trabalho para a revisão constitucional. A líder do PSD/Açores, talvez movida por um voluntarismo oportunista, foi lesta em designar o Deputado Pedro Gomes para a missão, ungido de poderes ou saberes que ainda hoje se desconhecem. Dos trabalhos do azórico representante pouco ou nada se soube, sequer se foram dados a opinar ou aprovar aos seus companheiros e dirigentes. Pior, desde a noite da apresentação, no famoso Concelho Nacional, o que a líder do PSD/A tornou público, «sem dar cavaco» aos seus, foi o franco (?) regozijo por um “excelente projecto de revisão constitucional que respeita os compromissos políticos do presidente do PSD quanto às autonomias e confirma o seu empenho no aprofundamento do processo autonómico”, excepto … na parte do Representante da República, uma «originalidade» que, pelos vistos, é bastarda de mãe e pai. E se esse famoso projecto, durante dois meses sofreu mandos e desmandos, melhorias, aperfeiçoamentos ou remendos de «arrojo» em tantos outros capítulos, a excepção tocou às autonomias. (In)acção de quem?
O que resta, pois, é um molho de dúvidas contra uma singular certeza: a de que todas e quaisquer soluções que beliscassem a interpretação constitucional de Cavaco Silva para autonomias, fossem ignoradas, omitidas, escondidas.
Assim, por método ou soberba, o PSD/A não procurou consensos com o PS/Açores, caminho natural e único para fortalecer posições e soluções junto de Lisboa. Inclusive, sequer procurou concertar objectivos com os seus congéneres da madeirenses, já que, hoje, o PSD/Madeira declara, para quem quer ouvir, apenas contar com o PS/Açores para garantir soluções constitucionais que assegurem uma evolução do processo autonómico.
Este terá sido, afinal, o PSD/A de alguns. O PSD/A que foi empurrado para as soluções de Cavaco Silva e dos dirigentes nacionais, rasgando compromissos, renegando a sua História e desrespeitando os seus órgãos. A troco de quê? Ignora-se…
Este é, afinal, um PSD/Açores cada vez mais exíguo. Exíguo nos conteúdos, nas proposituras e, necessariamente, nas lideranças. Este partido parece, infelizmente, cada vez mais PSD e cada vez menos Açores.
No Diário Insular
domingo, maio 17, 2009
DA SORTE E DA IMPERFEIÇÃO…
Pago os meus impostos, não fumo, não tenho animais domésticos, não cuspo para o chão, não bato em crianças nem em mulheres, ando a pé, sou tolerante, tenho boas relações de vizinhança e profissionais. Mas, bebo às refeições, não vou à missa, não gosto de touradas à corda e gosto de touros e de toureio apeado com sorte de varas ou com touros de morte. Sim, estou com o primeiro vulto da filosofia espanhola do século XX, Ortega y Gasset, quando digo que, em matéria de touros, tiro “férias da humanidade” (1). Sou um Homem, sou imperfeito e admito a minha imperfeição civilizacional perante os ditames da sociedade do politicamente correcto.
Serve esta genuflexão pública a propósito do intolerante debate sobre a reintrodução da sorte de varas nos Açores, e horas antes de saber se a mesma terá aprovação na Assembleia Legislativa.
Conforme corre, invocando princípios éticos e filosóficos, no entender de alguns, essa decisão pode corresponder a um retrocesso civilizacional. Ora, não negando a solidez de alguma argumentação, a verdade é que estou mais seguro desse retrocesso na incapacidade de ouvir, de permitir a expressão de uma opinião ou de um gosto divergente, do que na reintrodução da sorte de varas nos Açores.
Filosoficamente não ficarei assim tão mal acompanhado se citando Ortega y Gasset considerar que “Somos de uma condição tão paradoxal que cada dia requer maior artifício dar-nos o gosto de ser algumas vezes «seres naturais». Mas por grande e engenhoso que esse artifício seja resultará vão se aquele instinto feroz, já evanescente, se apaga por completo na nossa espécie”, por isso, “necessitamos de conservar esse acre impulso que do ante-home herdámos. Só ele nos permite o luxo maior de todos que é poder gozar umas férias de humanidade mediante a nossa autêntica «imersão na Natureza»” reabilitando o que ainda se tem de animal “e isto somente pode consegui-lo pondo-se em relação com outro animal”.
E, no domínio da Ética, volto a socorrer-me do filósofo espanhol quando, não questionando a legitimidade dos interesses da sociedade protectora dos animais, problematiza as suas ideias: “É de melhor ética que o touro bravo – uma das formas mais antigas, com rigor arcaica, extemporânea, dos bovídeos – desapareça como espécie e que, individualmente, morra no seu prado sem que mostre a sua gloriosa bravura?”, ou, quando conclui que “Evitar o sofrimento é uma norma ética; mas nada mais do que uma, e somente adquire dignidade de mandamento quando se articula com as restantes.”
Assim, na realidade, estaremos longe de um dogma. Aliás, a única verdade insofismável é que os interesses em causa não se conseguem auto-regular. Daí o recorrente apelo à intervenção pública para uma ponderação dos valores em causa. Nessa sequência, comungo, com Tomaz Dentinho, em como “a reintrodução da sorte de varas nos Açores tem efeitos privados, que interferem apenas com os que oferecem e procuram o espectáculo, e tem porventura efeitos públicos” (2), precisando que os efeitos públicos só existem, nesta matéria, pela imperfeição das regulações sociais, ou seja, pela ausência de auto-regulação.
Chegado aqui, impõe-se que diga que, na ponderação das variáveis, respeito pelo bem-estar animal e liberdade individual de assistir ao espectáculo tauromáquico completo, entendo que, na Região, só o povo da Ilha Terceira terá uma suficiente ligação natural ao touro que lhe permita questionar, ética e filosoficamente, se prefere que ele morra na lide ou no «mato» sem que mostre a sua gloriosa bravura. E é, por isso, que defendo que é, apenas, nessa realidade que a entidades públicas se deverão centrar: limitar a sorte de varas à Ilha Terceira, regulamentando um determinado número de lides por ano. É esta a minha opinião sobre um tema que não é nem «fracturante» nem prioritário na sociedade açoriana. Tomara outros se encontrem na praça pública com tamanho empenho e argumentação…
(1) Sobre a Caça e os Touros. Livros Cotovia, 2004
(2) http://www.auniao.com/noticias/ver.php?id=16180
Serve esta genuflexão pública a propósito do intolerante debate sobre a reintrodução da sorte de varas nos Açores, e horas antes de saber se a mesma terá aprovação na Assembleia Legislativa.
Conforme corre, invocando princípios éticos e filosóficos, no entender de alguns, essa decisão pode corresponder a um retrocesso civilizacional. Ora, não negando a solidez de alguma argumentação, a verdade é que estou mais seguro desse retrocesso na incapacidade de ouvir, de permitir a expressão de uma opinião ou de um gosto divergente, do que na reintrodução da sorte de varas nos Açores.
Filosoficamente não ficarei assim tão mal acompanhado se citando Ortega y Gasset considerar que “Somos de uma condição tão paradoxal que cada dia requer maior artifício dar-nos o gosto de ser algumas vezes «seres naturais». Mas por grande e engenhoso que esse artifício seja resultará vão se aquele instinto feroz, já evanescente, se apaga por completo na nossa espécie”, por isso, “necessitamos de conservar esse acre impulso que do ante-home herdámos. Só ele nos permite o luxo maior de todos que é poder gozar umas férias de humanidade mediante a nossa autêntica «imersão na Natureza»” reabilitando o que ainda se tem de animal “e isto somente pode consegui-lo pondo-se em relação com outro animal”.
E, no domínio da Ética, volto a socorrer-me do filósofo espanhol quando, não questionando a legitimidade dos interesses da sociedade protectora dos animais, problematiza as suas ideias: “É de melhor ética que o touro bravo – uma das formas mais antigas, com rigor arcaica, extemporânea, dos bovídeos – desapareça como espécie e que, individualmente, morra no seu prado sem que mostre a sua gloriosa bravura?”, ou, quando conclui que “Evitar o sofrimento é uma norma ética; mas nada mais do que uma, e somente adquire dignidade de mandamento quando se articula com as restantes.”
Assim, na realidade, estaremos longe de um dogma. Aliás, a única verdade insofismável é que os interesses em causa não se conseguem auto-regular. Daí o recorrente apelo à intervenção pública para uma ponderação dos valores em causa. Nessa sequência, comungo, com Tomaz Dentinho, em como “a reintrodução da sorte de varas nos Açores tem efeitos privados, que interferem apenas com os que oferecem e procuram o espectáculo, e tem porventura efeitos públicos” (2), precisando que os efeitos públicos só existem, nesta matéria, pela imperfeição das regulações sociais, ou seja, pela ausência de auto-regulação.
Chegado aqui, impõe-se que diga que, na ponderação das variáveis, respeito pelo bem-estar animal e liberdade individual de assistir ao espectáculo tauromáquico completo, entendo que, na Região, só o povo da Ilha Terceira terá uma suficiente ligação natural ao touro que lhe permita questionar, ética e filosoficamente, se prefere que ele morra na lide ou no «mato» sem que mostre a sua gloriosa bravura. E é, por isso, que defendo que é, apenas, nessa realidade que a entidades públicas se deverão centrar: limitar a sorte de varas à Ilha Terceira, regulamentando um determinado número de lides por ano. É esta a minha opinião sobre um tema que não é nem «fracturante» nem prioritário na sociedade açoriana. Tomara outros se encontrem na praça pública com tamanho empenho e argumentação…
(1) Sobre a Caça e os Touros. Livros Cotovia, 2004
(2) http://www.auniao.com/noticias/ver.php?id=16180
segunda-feira, maio 04, 2009
PRIMAVERA EM 2009
Correu o 17 de Abril, sem estudantes e polícias à pancada, e o 25 de Abril, sem revolução mas com flores, passará o 1 de Maio, sem trabalho, e o 9 do mesmo mês acordará, para a Europa, envergonhado, pois a conjuntura faz esquecer que ao 7.º de Junho reafirmaremos o nosso empenho no Projecto Europeu. Correm os dias e as datas e as pequenas agendas pouco nos deixam. Submersos entre o que ouvimos e o que gostaríamos de ouvir. Respigo no repositório revolucionário uma quadratura fechada em instituições políticas representativas. Fala-se pouco em novas formas de participação democrática nas instituições, das outras instituições, no tecido orgânico da sociedade moderna. Fala-se menos de como criar e garantir dinâmicas para que nessas instituições se reúnam as lideranças mais activas e criadoras e que os mais jovens se acolham no seu governo e que se assegure a respectiva autonomia e prestação de contas com a sociedade, para permitir que o diálogo e influência nessa sociedade se produza e reproduza.
Gostaria de ouvir mais vezes que não é só por dentro que se mudam as instituições nem só por fora que elas se garantem. E que a democracia dá muito trabalho. E que é preciso conversar, dialogar, dar explicações, aguentar injustiças…
Nesta Primavera, como no Inverno, fala-se muito no «tecido produtivo», no «mercado», na «liquidez», nas «finanças» e na «economia», e de menos no conhecimento. No Ensino Superior. No seu potencial de alavancagem para a superação das dificuldades estruturais e conjunturais, de qualquer país, deste País. Porque as Universidades são instituições centrais para ultrapassar os processos de crise. Porque se deve reforçar a confiança na sua formação, qualificação, actualização, reconversão, produção de ciência e do conhecimento, da investigação que procura intervir sobre a realidade, da valorização social e económica do conhecimento, da transferência tecnológica para a sociedade de novos modos e processos de organização económica, social e industrial. Ter coragem para falar do que é importante.
E, assim, Maio chegou-nos formatado para uma Europa (a das eleições ao Parlamento Europeu) que se esgota no primeiro de três actos eleitorais (a 7 de Junho), num país televisionado que só soletra uma «cega-rega» pequena quando se lhe obrigava uma agenda maior. Falar da Europa com uma política de coesão social com igualdade de direitos na protecção social, especialmente em situações de desemprego e pobreza, de falar do caminho para a harmonização fiscal, da regulação financeira trans-europeia, da política europeia de defesa comum, da política energética e de transportes comum que se reflicta nos preços pagos pelos consumidores, da política europeia do conhecimento e da investigação que potencie o investimento em projectos transnacionais, dos alargamentos faseados, dos acordos com os países em desenvolvimento, da coesão territorial com políticas diferentes para situações diferentes. Ter a coragem de pedir mais Europa.
Ter coragem nesta Primavera de 2009. Talvez já não lembrem que passam 40 anos da crise académica de 69, até porque já não andam por aí os polícias e os estudantes à pancada. Mas quem não reconhece o porquê daqueles, tantos, Porquês?
Ponta Delgada, 28 de Abril de 2009
Gostaria de ouvir mais vezes que não é só por dentro que se mudam as instituições nem só por fora que elas se garantem. E que a democracia dá muito trabalho. E que é preciso conversar, dialogar, dar explicações, aguentar injustiças…
Nesta Primavera, como no Inverno, fala-se muito no «tecido produtivo», no «mercado», na «liquidez», nas «finanças» e na «economia», e de menos no conhecimento. No Ensino Superior. No seu potencial de alavancagem para a superação das dificuldades estruturais e conjunturais, de qualquer país, deste País. Porque as Universidades são instituições centrais para ultrapassar os processos de crise. Porque se deve reforçar a confiança na sua formação, qualificação, actualização, reconversão, produção de ciência e do conhecimento, da investigação que procura intervir sobre a realidade, da valorização social e económica do conhecimento, da transferência tecnológica para a sociedade de novos modos e processos de organização económica, social e industrial. Ter coragem para falar do que é importante.
E, assim, Maio chegou-nos formatado para uma Europa (a das eleições ao Parlamento Europeu) que se esgota no primeiro de três actos eleitorais (a 7 de Junho), num país televisionado que só soletra uma «cega-rega» pequena quando se lhe obrigava uma agenda maior. Falar da Europa com uma política de coesão social com igualdade de direitos na protecção social, especialmente em situações de desemprego e pobreza, de falar do caminho para a harmonização fiscal, da regulação financeira trans-europeia, da política europeia de defesa comum, da política energética e de transportes comum que se reflicta nos preços pagos pelos consumidores, da política europeia do conhecimento e da investigação que potencie o investimento em projectos transnacionais, dos alargamentos faseados, dos acordos com os países em desenvolvimento, da coesão territorial com políticas diferentes para situações diferentes. Ter a coragem de pedir mais Europa.
Ter coragem nesta Primavera de 2009. Talvez já não lembrem que passam 40 anos da crise académica de 69, até porque já não andam por aí os polícias e os estudantes à pancada. Mas quem não reconhece o porquê daqueles, tantos, Porquês?
Ponta Delgada, 28 de Abril de 2009
domingo, abril 19, 2009
ANGRA, O MUNICÍPIO FELIZ
Nascido e criado em Ponta Delgada, a residir, por opção, em Angra do Heroísmo, desde 1998, recebo via imprensa a resposta que, há 10 anos, repito, sem cansar, à pergunta “Porquê viver em Angra do Heroísmo?”. Segundo o Estudo do Instituto de Tecnologia Comportamental (1), em parceria com o Semanário SOL, Angra do Heroísmo é o concelho, de Portugal, em que os munícipes mais consideram que vale a pena viver. Evidência para alguns, surpresa para os incautos, terreno fértil para os promotores do “bem comum”, azia para os «profetas da desgraça alheia» e impossibilidade para os cobiçadores militantes da “galinha da vizinha” micaelense…
E só por maledicência ou miopia intelectual não se poderá ver que a importância dessa classificação vai muito além da mera medalha de enfeitar peito, encher boca ou página de jornal. Na verdade, a metodologia científica usada (indicadores objectivos – condições de vida e infra-estruturas disponibilizadas por cada município) e subjectivos (a forma como as populações avaliam essas mesmas condições), tendo por base os estudos efectuados pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Trabalho e de Vida – EUROFOUND (2), certificam que o conceito de qualidade de vida sobre o qual se está a trabalhar está, efectivamente, relacionado com a possibilidade das pessoas alcançarem os seus objectivos e escolherem o seu estilo de vida ideal. Ou seja, com o fim primeiro do que devem ser as políticas públicas de planeamento e investimento: a criação de condições de igualdade para o desenvolvimento do projecto de vida de cada um dos cidadãos. Isto é, no limite, a concretização daquele que é o verdadeiro projecto da autonomia democrática.
«Feliz», pois, do autarca que tem dos seus munícipes este retorno de felicidade. «Feliz» porque, de facto, não basta anunciá-lo para o ser. «Feliz» pelo grau máximo de satisfação que lhe é atribuído, mas, sobretudo, «Feliz» pelo desafio público que lhe está implícito: continuar a ser dona do seu destino, sendo, nos anos vindouros, o concelho, de Portugal, em que os munícipes mais consideram que vale a pena viver e em que as pessoas se mostram mais positivas (com optimismo face ao futuro, a satisfação com a vida em geral ou no nível de felicidade), além de procurar ser, de forma criativa, afincada e pressurosa, o concelho que mais evolui na ponderação dos factores objectivos do estudo.
Por isso é que entendo que esta ferramenta - que trabalha domínios tão diversos como: ambiente; urbanismo e habitação; acessibilidades e transportes; ensino e formação; economia e emprego; saúde; cultura e lazer; turismo; felicidade; diversidade e tolerância -, também se pode enquadrar como mais um contributo para a definição das estratégias públicas em matéria de planeamento e investimento nos concelhos da Região. A construção de uns Açores melhores, também passa pelo exemplo desta «Angra Positiva». Angra do Heroísmo, um «Concelho Feliz», de facto!
(1) http://www.intec.com.pt/index.php?option=com_frontpage&Itemid=1
(2) http://europa.eu/scadplus/leg/pt/cha/c11111.htm
Ponta Delgada, 15 de Abril de 2009
E só por maledicência ou miopia intelectual não se poderá ver que a importância dessa classificação vai muito além da mera medalha de enfeitar peito, encher boca ou página de jornal. Na verdade, a metodologia científica usada (indicadores objectivos – condições de vida e infra-estruturas disponibilizadas por cada município) e subjectivos (a forma como as populações avaliam essas mesmas condições), tendo por base os estudos efectuados pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Trabalho e de Vida – EUROFOUND (2), certificam que o conceito de qualidade de vida sobre o qual se está a trabalhar está, efectivamente, relacionado com a possibilidade das pessoas alcançarem os seus objectivos e escolherem o seu estilo de vida ideal. Ou seja, com o fim primeiro do que devem ser as políticas públicas de planeamento e investimento: a criação de condições de igualdade para o desenvolvimento do projecto de vida de cada um dos cidadãos. Isto é, no limite, a concretização daquele que é o verdadeiro projecto da autonomia democrática.
«Feliz», pois, do autarca que tem dos seus munícipes este retorno de felicidade. «Feliz» porque, de facto, não basta anunciá-lo para o ser. «Feliz» pelo grau máximo de satisfação que lhe é atribuído, mas, sobretudo, «Feliz» pelo desafio público que lhe está implícito: continuar a ser dona do seu destino, sendo, nos anos vindouros, o concelho, de Portugal, em que os munícipes mais consideram que vale a pena viver e em que as pessoas se mostram mais positivas (com optimismo face ao futuro, a satisfação com a vida em geral ou no nível de felicidade), além de procurar ser, de forma criativa, afincada e pressurosa, o concelho que mais evolui na ponderação dos factores objectivos do estudo.
Por isso é que entendo que esta ferramenta - que trabalha domínios tão diversos como: ambiente; urbanismo e habitação; acessibilidades e transportes; ensino e formação; economia e emprego; saúde; cultura e lazer; turismo; felicidade; diversidade e tolerância -, também se pode enquadrar como mais um contributo para a definição das estratégias públicas em matéria de planeamento e investimento nos concelhos da Região. A construção de uns Açores melhores, também passa pelo exemplo desta «Angra Positiva». Angra do Heroísmo, um «Concelho Feliz», de facto!
(1) http://www.intec.com.pt/index.php?option=com_frontpage&Itemid=1
(2) http://europa.eu/scadplus/leg/pt/cha/c11111.htm
Ponta Delgada, 15 de Abril de 2009
domingo, abril 05, 2009
M´ESPANTO ÀS VEZES…
No início foi o verbo. “Foi a Junta Regional dos Açores que lançou as bases experimentais para uma efectiva administração autónoma do arquipélago unificado como região. Fê-lo num esforço de superação das tendências divisionistas decorrentes, além do mais, da já condenada administração distrital, e nessa perspectiva deu corpo à deslocalização das suas vogalias, desdobrando-se por Angra do Heroísmo, Horta e Ponta Delgada, como meio de estimular a solidariedade inter-insular”, e deste testemunho de Álvaro Monjardino (*) sublinho, para o que hoje me traz, as seguintes passagens: o «arquipélago unificado como região», a «superação das tendências divisionistas» o «estimular a solidariedade inter-insular».
Depois, mais de 30 anos de dialéctica progressiva no caldo sociopolítico regional que acolheu a aspiração autonomista e a aspiração desenvolvimentista. Hoje, um quadro político-partidário que ameaça tornar-se numa pobre e podre manifestação maniqueísta entre os que entendem ser um dever e um devir continuar a conjugar solidariedade com autonomia, e sustentabilidade com desenvolvimento, e os que renegam, militante e irresponsavelmente, a solidariedade inter-insular, com fins mediáticos e mediatos de luta e manutenção do e pelo poder, condenando o húmus e a coesão política desta região autónoma.
Assim, acuso esta opção convicta e premeditada, daqueles filhos (bastardos?) do «partido fundador da autonomia», por uma constante degradação do discurso político através da afirmação do seu contexto ilhéu, ou concelhio, de que se arrogam genuína e exclusivamente representar, em contraposição ao dos restantes, valorizando velhas rixas, velhos temores, velhas estratégias. E se no discurso primário de alguns «novos crentes», instalados na demissão irresponsável dos fundadores sociais-democratas terceirenses, se apressaram a cavalgar, demagógica e infantilmente, os «companheiros» do Faial, longe estava de pensar poder algum dia assistir a uma surreal conferência de imprensa reivindicativa da estrutura de Ilha São Miguel ou ao regateio miserável, pelo Deputado do Pico, de critérios comparativos de investimento do Plano Regional fundados na densidade populacional ou geográfica. Tudo isso com o beneplácito do rosto “sebastianista” que replica políticas do passado envernizadas no anacronismo do «mãos à obra», e que se prognostica a um futuro seja ele qual for, seja ele em que contexto for, desde que lhes seja favorável. Nem tudo se explica na orfandade política ou ideológica, ou sequer na «mãe-porca» da democracia político-partidária insular. «Pasmado e duvidoso do que vi/m´espanto às vezes, outras m’avergonho», na espuma dos dias que correm, Sá de Miranda nunca seria tão bem citado. Valer-nos-á este Povo Açoriano?
(*) In “A criação da autonomia regional e as suas instituições”. História dos Açores, Vol, II, pag. 399
Depois, mais de 30 anos de dialéctica progressiva no caldo sociopolítico regional que acolheu a aspiração autonomista e a aspiração desenvolvimentista. Hoje, um quadro político-partidário que ameaça tornar-se numa pobre e podre manifestação maniqueísta entre os que entendem ser um dever e um devir continuar a conjugar solidariedade com autonomia, e sustentabilidade com desenvolvimento, e os que renegam, militante e irresponsavelmente, a solidariedade inter-insular, com fins mediáticos e mediatos de luta e manutenção do e pelo poder, condenando o húmus e a coesão política desta região autónoma.
Assim, acuso esta opção convicta e premeditada, daqueles filhos (bastardos?) do «partido fundador da autonomia», por uma constante degradação do discurso político através da afirmação do seu contexto ilhéu, ou concelhio, de que se arrogam genuína e exclusivamente representar, em contraposição ao dos restantes, valorizando velhas rixas, velhos temores, velhas estratégias. E se no discurso primário de alguns «novos crentes», instalados na demissão irresponsável dos fundadores sociais-democratas terceirenses, se apressaram a cavalgar, demagógica e infantilmente, os «companheiros» do Faial, longe estava de pensar poder algum dia assistir a uma surreal conferência de imprensa reivindicativa da estrutura de Ilha São Miguel ou ao regateio miserável, pelo Deputado do Pico, de critérios comparativos de investimento do Plano Regional fundados na densidade populacional ou geográfica. Tudo isso com o beneplácito do rosto “sebastianista” que replica políticas do passado envernizadas no anacronismo do «mãos à obra», e que se prognostica a um futuro seja ele qual for, seja ele em que contexto for, desde que lhes seja favorável. Nem tudo se explica na orfandade política ou ideológica, ou sequer na «mãe-porca» da democracia político-partidária insular. «Pasmado e duvidoso do que vi/m´espanto às vezes, outras m’avergonho», na espuma dos dias que correm, Sá de Miranda nunca seria tão bem citado. Valer-nos-á este Povo Açoriano?
(*) In “A criação da autonomia regional e as suas instituições”. História dos Açores, Vol, II, pag. 399
sexta-feira, março 27, 2009
DOS AÇORES SABE (SEMPRE) MELHOR
Quantas vezes ouvimos e lemos, por esse mundo fora, campanhas promocionais com vista ao consumo dos produtos locais ou nacionais? Quantas vezes não pensámos na assertividade dessas mesmas campanhas e na potencialidade de as fazer replicar no nosso quintal regional? Às perguntas retóricas, a respostas sempre nos pareceram evidentes. Ponto final?
Nem por isso, todas essas certezas apenas serviram o descanso das nossas consciências, no fundo o que estamos a querer dizer é: o Governo que faça alguma coisa! Ora, a crua verdade é outra, ou seja, um claro imobilismo e, mesmo, uma desresponsabilização individual em matéria de consumo e, em especial, em matéria de preferência aos produtos regionais, que, inconscientemente, tem prejudicado a nossa economia, até porque, em muitos casos, na relação preço/qualidade, não surge qualquer benefício directo para a nossa saúde e carteira.
Procuremos responder ao seguinte simples exercício doméstico:
Faço compras no Hiper e no Supermercado a qualquer hora, mas não vou ao mercado ao sábado de manhã?
Compro pão na padaria ou nos congelados pré-feitos?
Consumo peixe fresco?
Consumo carne biológica?
Quando compro frutas ou legumes estou atento à sua proveniência?
Quando peço sobremesa sou indiferente ao abacaxi ou ao pastel de nata congelado?
Quando tomo ou peço chá pergunto se é da gorreana ou do porto formoso?
Quando compro leite, queijo, manteiga ou iogurtes prefiro os das fábricas regionais?
Quando escolho conservas olho para a origem no rótulo?
Quando procuro saladas lembro-me das biológicas de produção local?
Quando compro açúcar ou farinha são da Região?
Quando compro água engarrafada procuro a regional?
Quantas vezes, no ano, bebo vinho, cerveja ou refrigerantes açorianos?
Etc etc …
Para a maioria dos nossos concidadãos as respostas tenderiam para o não, no entanto, paradoxalmente a esta quase ausência de uma consciência regional que deve acompanhar o acto de consumo, a atitude do autóctone tem sido, por todos reconhecida, de orgulho e empenho em dar a conhecer ao forasteiro o melhor que cá se produz. Quem não ofereceu produtos regionais a quem nos visita, apelidando-os como os “melhores do país” ou “bons em qualquer mesa”? Quem não levou na sua bagagem com destino a Lisboa ou ao Porto, queijos, queijadas, chá, mel, ananases, vinho ou aguardente para ofertar os seus mais queridos? Tudo isto é verdade, e no entanto…
Não será possível fazermos todos melhor pela nossa terra? Certamente que sim! Basta querer! Eu consumo produtos açorianos, e você?
Ponta Delgada, 24 de Março de 2009
Publicado no Correio dos Açores
Nem por isso, todas essas certezas apenas serviram o descanso das nossas consciências, no fundo o que estamos a querer dizer é: o Governo que faça alguma coisa! Ora, a crua verdade é outra, ou seja, um claro imobilismo e, mesmo, uma desresponsabilização individual em matéria de consumo e, em especial, em matéria de preferência aos produtos regionais, que, inconscientemente, tem prejudicado a nossa economia, até porque, em muitos casos, na relação preço/qualidade, não surge qualquer benefício directo para a nossa saúde e carteira.
Procuremos responder ao seguinte simples exercício doméstico:
Faço compras no Hiper e no Supermercado a qualquer hora, mas não vou ao mercado ao sábado de manhã?
Compro pão na padaria ou nos congelados pré-feitos?
Consumo peixe fresco?
Consumo carne biológica?
Quando compro frutas ou legumes estou atento à sua proveniência?
Quando peço sobremesa sou indiferente ao abacaxi ou ao pastel de nata congelado?
Quando tomo ou peço chá pergunto se é da gorreana ou do porto formoso?
Quando compro leite, queijo, manteiga ou iogurtes prefiro os das fábricas regionais?
Quando escolho conservas olho para a origem no rótulo?
Quando procuro saladas lembro-me das biológicas de produção local?
Quando compro açúcar ou farinha são da Região?
Quando compro água engarrafada procuro a regional?
Quantas vezes, no ano, bebo vinho, cerveja ou refrigerantes açorianos?
Etc etc …
Para a maioria dos nossos concidadãos as respostas tenderiam para o não, no entanto, paradoxalmente a esta quase ausência de uma consciência regional que deve acompanhar o acto de consumo, a atitude do autóctone tem sido, por todos reconhecida, de orgulho e empenho em dar a conhecer ao forasteiro o melhor que cá se produz. Quem não ofereceu produtos regionais a quem nos visita, apelidando-os como os “melhores do país” ou “bons em qualquer mesa”? Quem não levou na sua bagagem com destino a Lisboa ou ao Porto, queijos, queijadas, chá, mel, ananases, vinho ou aguardente para ofertar os seus mais queridos? Tudo isto é verdade, e no entanto…
Não será possível fazermos todos melhor pela nossa terra? Certamente que sim! Basta querer! Eu consumo produtos açorianos, e você?
Ponta Delgada, 24 de Março de 2009
Publicado no Correio dos Açores
domingo, março 08, 2009
A MÃO DO HOMEM
Muitos dos estudos contemporâneos sobre políticas públicas revelam que um dos vectores mais esquecidos na tomada de decisões públicas é o da verificação das consequências/impactos sociais e económicos a médio/longo prazo, seja porque, em algumas áreas, o estado das artes, ainda, não consegue fazer esse juízo de prognose, seja, porque os interesses políticos, ou públicos, do momento, condicionam determinantemente a opção do decisor.
Assim, ao longo dos anos, muitas das decisões tomadas no impulso da reacção, na ausência da análise, na omissão do planeamento ou na impreparação do contexto, têm-se revelado, no médio/longo prazo, gravosamente prejudiciais às nossas populações, seja exaurindo recursos financeiros na reposição de soluções integradas, seja hipotecando recursos naturais indispensáveis à sustentabilidade de novas vias de desenvolvimento.
A ciência política, que tem acompanhado mais estreitamente estas questões, tem identificado múltiplos conceitos e estratégias que se mostram indispensáveis à melhor implementação de políticas públicas: o empowerment (no sentido de ter acesso a toda a informação e recursos disponíveis para a melhor tomada de decisão), a participação (através da audição e envolvimento dos sujeitos directos ou indirectos da decisão), a accountability (a obrigação de membros de um órgão administrativo ou representativo de prestarem contas a instâncias controladoras ou a seus representados) e a descentralização (enquanto transferência da capacidade decisória para níveis, públicos ou privados, mais próximos dos sujeitos da decisão).
Ora, para quem olha com desconfiança para a bondade dessas prosas, talvez seja de lembrar que, no fundo, o que estamos aqui a tratar são assuntos que a todos nos tocam, todos os dias, de forma directa ou indirecta. Como exemplos contemporâneos de amargas consequências de decisões impensadas ou deficientemente planeadas no passado, relembro que o ciclo da água esteve à beira de ser interrompido na Ilha Terceira, com as arroteias, na Caldeira Guilherme Moniz (zona crítica de infiltração de água), que começaram a ser realizadas, na segunda metade dos anos setenta do século XX, com o então Plano Pecuário dos Açores. Este “sonho” antigo, já do século XIX, visava arrotear e disponibilizar para a produção pecuária vastas zonas que estavam entregues à natureza e que se consideravam, com base no senso comum, desaproveitadas.
Outra situação pública, é a da eutrofização das lagoas na Região, que, por não ser um problema recente, nem exclusivo das lagoas açorianas, agrava a responsabilidade passada dos interveniente públicos e privados, já que a causa genérica, estando há muito identificada (afluxos excessivos de elementos nutritivos às águas paradas), foi, no nosso caso, potenciada pelas actividades produtivas instaladas nas bacias hidrográficas, através dos adubos que encharcaram as pastagens. E quem pensou que estava a proteger as populações através desse tipo de incentivo à produção pecuária, não viu mais longe, ou esqueceu ou não foi lembrado, dos impactos subsequentes nas reservas estratégicas de água, na protecção da avifauna ou no grave hipotecar das potencialidades turísticas da Região, todos eles bem mais penalizadores para o interesse público regional.
Finalmente, um caso que parece recorrente: no Centro de Saúde da cidade da Horta, foram mandadas retirar as telhas de fibrocimento, material que contém na sua composição entre 10% a 15% de amianto, por estar provado que são um risco para a saúde pública. Igualmente, foram mandadas retirar as telhas de fibrocimento da Escola Básica e Secundária de São Roque do Pico. No âmbito da I Jornada do Amianto, que decorreu em Maio em Lisboa, os especialistas sublinharam que estas coberturas apresentam um risco cancerígeno baixo mas que há situações mais preocupantes que se verificam na presença de amianto em material friável (maior facilidade de libertação das fibras) em canalizações, portas corta-fogo ou isolamento entre compartimentos.
Os Açorianos em geral, e os políticos e empresários em particular, não podem ignorar estes factos e os respectivos contextos. A lição parece cristalina: nenhum decisor deve ter legitimidade suficiente para atirar encargos, de tal monta, para o futuro!
Ponta Delgada, 04 de Março de 2009
Assim, ao longo dos anos, muitas das decisões tomadas no impulso da reacção, na ausência da análise, na omissão do planeamento ou na impreparação do contexto, têm-se revelado, no médio/longo prazo, gravosamente prejudiciais às nossas populações, seja exaurindo recursos financeiros na reposição de soluções integradas, seja hipotecando recursos naturais indispensáveis à sustentabilidade de novas vias de desenvolvimento.
A ciência política, que tem acompanhado mais estreitamente estas questões, tem identificado múltiplos conceitos e estratégias que se mostram indispensáveis à melhor implementação de políticas públicas: o empowerment (no sentido de ter acesso a toda a informação e recursos disponíveis para a melhor tomada de decisão), a participação (através da audição e envolvimento dos sujeitos directos ou indirectos da decisão), a accountability (a obrigação de membros de um órgão administrativo ou representativo de prestarem contas a instâncias controladoras ou a seus representados) e a descentralização (enquanto transferência da capacidade decisória para níveis, públicos ou privados, mais próximos dos sujeitos da decisão).
Ora, para quem olha com desconfiança para a bondade dessas prosas, talvez seja de lembrar que, no fundo, o que estamos aqui a tratar são assuntos que a todos nos tocam, todos os dias, de forma directa ou indirecta. Como exemplos contemporâneos de amargas consequências de decisões impensadas ou deficientemente planeadas no passado, relembro que o ciclo da água esteve à beira de ser interrompido na Ilha Terceira, com as arroteias, na Caldeira Guilherme Moniz (zona crítica de infiltração de água), que começaram a ser realizadas, na segunda metade dos anos setenta do século XX, com o então Plano Pecuário dos Açores. Este “sonho” antigo, já do século XIX, visava arrotear e disponibilizar para a produção pecuária vastas zonas que estavam entregues à natureza e que se consideravam, com base no senso comum, desaproveitadas.
Outra situação pública, é a da eutrofização das lagoas na Região, que, por não ser um problema recente, nem exclusivo das lagoas açorianas, agrava a responsabilidade passada dos interveniente públicos e privados, já que a causa genérica, estando há muito identificada (afluxos excessivos de elementos nutritivos às águas paradas), foi, no nosso caso, potenciada pelas actividades produtivas instaladas nas bacias hidrográficas, através dos adubos que encharcaram as pastagens. E quem pensou que estava a proteger as populações através desse tipo de incentivo à produção pecuária, não viu mais longe, ou esqueceu ou não foi lembrado, dos impactos subsequentes nas reservas estratégicas de água, na protecção da avifauna ou no grave hipotecar das potencialidades turísticas da Região, todos eles bem mais penalizadores para o interesse público regional.
Finalmente, um caso que parece recorrente: no Centro de Saúde da cidade da Horta, foram mandadas retirar as telhas de fibrocimento, material que contém na sua composição entre 10% a 15% de amianto, por estar provado que são um risco para a saúde pública. Igualmente, foram mandadas retirar as telhas de fibrocimento da Escola Básica e Secundária de São Roque do Pico. No âmbito da I Jornada do Amianto, que decorreu em Maio em Lisboa, os especialistas sublinharam que estas coberturas apresentam um risco cancerígeno baixo mas que há situações mais preocupantes que se verificam na presença de amianto em material friável (maior facilidade de libertação das fibras) em canalizações, portas corta-fogo ou isolamento entre compartimentos.
Os Açorianos em geral, e os políticos e empresários em particular, não podem ignorar estes factos e os respectivos contextos. A lição parece cristalina: nenhum decisor deve ter legitimidade suficiente para atirar encargos, de tal monta, para o futuro!
Ponta Delgada, 04 de Março de 2009
domingo, fevereiro 22, 2009
DOM(ESTICADOS)?
Aprendendo com as lições dos outros. Segundo os contos da população local da Ilha de Guadalupe, nas Antilhas, a sueste de Porto Rico, os escravos mais rebeldes trazidos em barcos de África foram remetidos para aquela ilha enquanto os mais submissos foram levados para as explorações de cana-de-açúcar da Martinica.
Seja verdadeira ou não essa estória, reza a história actual que, depois de um mês de greve geral, a situação na Guadalupe parece não querer acalmar, uma vez que, a cada dia que passa, os “guadalupenses” dão mais apoio ao protesto contra o aumento do custo de vida.
Após reunir cinquenta mil pessoas no sábado passado, um colectivo de 49 organizações sindicais e associativas que retira a sua força da junção entre os meios político, cultural e económico, conhecido como Liyannaj Kont Pwofitasyon (LKP, Movimento Contra a Exploração, no crioulo local), garantiu que a paralisação vai continuar até que o governo francês atenda às exigências dos locais (entre estas constam a diminuição dos preços dos bens essenciais e um aumento de 200 euros do salário mínimo). Este movimento já alastrou, entretanto, à Martinica, em greve geral há 15 dias, e a Guiana e a longínqua Reunião, no oceano Índico, estarão, também, em fase de preparação para um protesto idêntico. Conjuntamente com a Guadalupe, estes territórios, constituem os DOM (département d’outre-mer) franceses.
Os dados oficiais confirmam que a situação nos territórios ultramarinos franceses é, no mínimo, explosiva: o PIB é metade do registado na metrópole e o poder de compra dos seus habitantes menos 35%. O desemprego na Guadalupe e na Martinica, cada uma delas com um pouco mais de 400.000 habitantes, oscila em torno dos 20%
Em Paris o Presidente Sarkosy acaba de anunciar um conselho interministerial do Ultramar e prepara-se para receber os representantes dos DOM. A criação de um conselho interministerial que ponha em prática a renovação das políticas nacionais para aqueles territórios fora uma promessa de campanha do presidente que tardava em ser cumprida. Das negociações que, entretanto, já decorreram com o Governo francês, resultou um documento de 131 pontos que terá repercussões imediatas na transparência e na baixa dos preços, na política de habitação, nos transportes, na formação, na saúde e na cultura. Mas, acabar com esta greve, não é acabar com esta crise.
O diagnóstico é que não se trata de um movimento epidérmico, mas de uma manifestação aguda alicerçada num tripé instável: a conjuntura económica desfavorável que grassa no planeta; o deficit estrutural da economia local e a crise existencial, ou política, do povo caribenho. Segundo os analistas mais representativos houve "um tremor de terra nas consciências, a sociedade de Guadalupe estava doente", identidade, poder de compra, desmantelamento sistemático das estruturas da sociedade crioula, eram sintomas de um mal-estar conhecido de todos, mas estavam a ser abafados pela classe política local e por um Estado paternalista. Ou seja, o conflito não podia deixar de ser político, mesmo que a questão da independência ou de uma mais vasta autonomia, ainda, não esteja a ser abordada.
Ora, o que revela a crise caribenha é um modelo de desenvolvimento económico esgotado porque se baseou, nos últimos 40 anos, somente em importações que alimentavam o sector do turismo, esquecendo o investimento nos sectores chave destinado à produção local e à exportação dos produtos endógenos. Este deficiente modelo económico era alavancado, fundamentalmente, pelas transferências financeiras da metrópole que, aumentando ano a ano, se justificavam na necessidade de dotar os locais de um nível de vida idêntico ao de Paris. Da plantação ao consumo, e daí ao hiper-consumo. Um triste fim pré-anunciado.
Hoje, nas palavras de Yves Jégo (*), Secretário de Estado francês para os territórios ultramarinos, “o além-mar precisa de amor. Mas um amor sincero que pressupõe um olhar lúcido e um discurso verdadeiro”, neste âmbito, o executivo francês considera aqueles territórios como “as guardas avançadas dos desafios do século XXI: o desafio ecológico (pela biodiversidade), o desafio marítimo (pelos recursos marinhos) e o desafio da diversidade (pelo universalismo cultural)“, assim, “O futuro da França e da Europa passa pelo além-mar”. Pois, pois, onde é que já ouvimos isto?
(*)http://www.lefigaro.fr/debats/2009/02/27/01005-20090227ARTFIG00002-guadeloupe-martinique-la-possibilite-des-iles-.php
Sé, 18 de Fevereiro de 2009
Seja verdadeira ou não essa estória, reza a história actual que, depois de um mês de greve geral, a situação na Guadalupe parece não querer acalmar, uma vez que, a cada dia que passa, os “guadalupenses” dão mais apoio ao protesto contra o aumento do custo de vida.
Após reunir cinquenta mil pessoas no sábado passado, um colectivo de 49 organizações sindicais e associativas que retira a sua força da junção entre os meios político, cultural e económico, conhecido como Liyannaj Kont Pwofitasyon (LKP, Movimento Contra a Exploração, no crioulo local), garantiu que a paralisação vai continuar até que o governo francês atenda às exigências dos locais (entre estas constam a diminuição dos preços dos bens essenciais e um aumento de 200 euros do salário mínimo). Este movimento já alastrou, entretanto, à Martinica, em greve geral há 15 dias, e a Guiana e a longínqua Reunião, no oceano Índico, estarão, também, em fase de preparação para um protesto idêntico. Conjuntamente com a Guadalupe, estes territórios, constituem os DOM (département d’outre-mer) franceses.
Os dados oficiais confirmam que a situação nos territórios ultramarinos franceses é, no mínimo, explosiva: o PIB é metade do registado na metrópole e o poder de compra dos seus habitantes menos 35%. O desemprego na Guadalupe e na Martinica, cada uma delas com um pouco mais de 400.000 habitantes, oscila em torno dos 20%
Em Paris o Presidente Sarkosy acaba de anunciar um conselho interministerial do Ultramar e prepara-se para receber os representantes dos DOM. A criação de um conselho interministerial que ponha em prática a renovação das políticas nacionais para aqueles territórios fora uma promessa de campanha do presidente que tardava em ser cumprida. Das negociações que, entretanto, já decorreram com o Governo francês, resultou um documento de 131 pontos que terá repercussões imediatas na transparência e na baixa dos preços, na política de habitação, nos transportes, na formação, na saúde e na cultura. Mas, acabar com esta greve, não é acabar com esta crise.
O diagnóstico é que não se trata de um movimento epidérmico, mas de uma manifestação aguda alicerçada num tripé instável: a conjuntura económica desfavorável que grassa no planeta; o deficit estrutural da economia local e a crise existencial, ou política, do povo caribenho. Segundo os analistas mais representativos houve "um tremor de terra nas consciências, a sociedade de Guadalupe estava doente", identidade, poder de compra, desmantelamento sistemático das estruturas da sociedade crioula, eram sintomas de um mal-estar conhecido de todos, mas estavam a ser abafados pela classe política local e por um Estado paternalista. Ou seja, o conflito não podia deixar de ser político, mesmo que a questão da independência ou de uma mais vasta autonomia, ainda, não esteja a ser abordada.
Ora, o que revela a crise caribenha é um modelo de desenvolvimento económico esgotado porque se baseou, nos últimos 40 anos, somente em importações que alimentavam o sector do turismo, esquecendo o investimento nos sectores chave destinado à produção local e à exportação dos produtos endógenos. Este deficiente modelo económico era alavancado, fundamentalmente, pelas transferências financeiras da metrópole que, aumentando ano a ano, se justificavam na necessidade de dotar os locais de um nível de vida idêntico ao de Paris. Da plantação ao consumo, e daí ao hiper-consumo. Um triste fim pré-anunciado.
Hoje, nas palavras de Yves Jégo (*), Secretário de Estado francês para os territórios ultramarinos, “o além-mar precisa de amor. Mas um amor sincero que pressupõe um olhar lúcido e um discurso verdadeiro”, neste âmbito, o executivo francês considera aqueles territórios como “as guardas avançadas dos desafios do século XXI: o desafio ecológico (pela biodiversidade), o desafio marítimo (pelos recursos marinhos) e o desafio da diversidade (pelo universalismo cultural)“, assim, “O futuro da França e da Europa passa pelo além-mar”. Pois, pois, onde é que já ouvimos isto?
(*)http://www.lefigaro.fr/debats/2009/02/27/01005-20090227ARTFIG00002-guadeloupe-martinique-la-possibilite-des-iles-.php
Sé, 18 de Fevereiro de 2009
domingo, fevereiro 08, 2009
MANTER O RUMO
A 22 de Agosto de 2004, estreei-me nas páginas do Diário Insular, com a provocação titulada de “Quarta Autonomia” (*). A urgência dessa participação pública justificava-se pela, então, fresca revisão constitucional de 2004, que tendo de passar por uma revisão estatutária, só agora consolidada, potenciava, o que considerei ser um desafio geracional no sentido da “reconstrução de todo um novo ordenamento jurídico regional que, desagrilhoado dos quadros definidos pela administração central ou das matrizes ideológicas que, atravessando o Atlântico, se nos impuseram”, de modo a afirmar-se como “a pedra angular de todo o desenvolvimento autonómico futuro.”
Ora se é verdade que a conjuntura económica e financeira internacional, ou a instabilidade política nacional, nos tentam, diariamente, no sentido de uma abordagem e reflexão exclusiva, não é menos certo que só os projectos políticos estruturados resistirão à volatilidade das intenções e das atenções.
Quer isto dizer que a intervenção pública reclamada, de modo social e politicamente aceite, sem deixar de antecipar ou responder às premências, não pode, em momento algum, perder o enquadramento estratégico global das respectivas políticas de desenvolvimento autonómico e, sobretudo, a percepção de que um dos maiores desafios geracionais, a médio/longo prazo, é o da reconstrução de todo um novo ordenamento jurídico e político regional.
Por isso, do mesmo modo que, militantemente, os entes públicos, políticos e executivos, devem (re)lembrar-se, e ser lembrados, do fio condutor subjacente aos fundamentos programáticos das políticas contratualizadas rumo ao desenvolvimento sustentado destas nove ilhas, também eles não podem desistir de lembrar aos parceiros empresários/cidadãos da importância e impacto do respectivo desempenho colectivo/individual, sinalizando que o futuro também se constrói com responsabilidade, solidariedade, concertação, participação, empreendedorismo, inovação, qualidade.
Assim, por mais que o procurem esconder ou fazer esquecer, os “novos” projectos à esquerda ou as “velhas” lideranças à direita não justificam as constantes incapacidades de, perante alguns dos verdadeiros desafios geracionais, apresentarem soluções ou propostas, mobilizarem alternativas ou enquadramentos políticos e ideológicos nas respectivas intervenções mediatizadas. O zero em rumo conduz ao zero diário das respectivas actuações. Ao demagogo catavento político só resta esperar dos outros “quanto pior melhor”. O povo açoriano, passados 115 anos de rumo autonómico, dispensa tamanho “altruísmo”.
(*) http://buledocha.blogspot.com/2004/08/quarta-autonomia.html
Ora se é verdade que a conjuntura económica e financeira internacional, ou a instabilidade política nacional, nos tentam, diariamente, no sentido de uma abordagem e reflexão exclusiva, não é menos certo que só os projectos políticos estruturados resistirão à volatilidade das intenções e das atenções.
Quer isto dizer que a intervenção pública reclamada, de modo social e politicamente aceite, sem deixar de antecipar ou responder às premências, não pode, em momento algum, perder o enquadramento estratégico global das respectivas políticas de desenvolvimento autonómico e, sobretudo, a percepção de que um dos maiores desafios geracionais, a médio/longo prazo, é o da reconstrução de todo um novo ordenamento jurídico e político regional.
Por isso, do mesmo modo que, militantemente, os entes públicos, políticos e executivos, devem (re)lembrar-se, e ser lembrados, do fio condutor subjacente aos fundamentos programáticos das políticas contratualizadas rumo ao desenvolvimento sustentado destas nove ilhas, também eles não podem desistir de lembrar aos parceiros empresários/cidadãos da importância e impacto do respectivo desempenho colectivo/individual, sinalizando que o futuro também se constrói com responsabilidade, solidariedade, concertação, participação, empreendedorismo, inovação, qualidade.
Assim, por mais que o procurem esconder ou fazer esquecer, os “novos” projectos à esquerda ou as “velhas” lideranças à direita não justificam as constantes incapacidades de, perante alguns dos verdadeiros desafios geracionais, apresentarem soluções ou propostas, mobilizarem alternativas ou enquadramentos políticos e ideológicos nas respectivas intervenções mediatizadas. O zero em rumo conduz ao zero diário das respectivas actuações. Ao demagogo catavento político só resta esperar dos outros “quanto pior melhor”. O povo açoriano, passados 115 anos de rumo autonómico, dispensa tamanho “altruísmo”.
(*) http://buledocha.blogspot.com/2004/08/quarta-autonomia.html
domingo, fevereiro 01, 2009
CIDADES CRIATIVAS?
As cidades são actores decisivos na economia de um País. Segundo Richard Florida, um dos maiores intelectuais do mundo nas áreas de competitividade económica, tendências demográficas e inovação cultural, os aglomerados urbanos que apostarem na criatividade serão aqueles, que no quadro da economia do conhecimento, maior relevância assumirão. A aposta na criatividade, consuma-se na atracção de talento, na existência de universidades e empresas inovadoras e na prática da tolerância.
Nesta sequência, as cidades criativas, tal como desenhadas e perspectivadas, por Charles Landry (1), desde os anos 90, têm-se afirmado autênticas, informais, e vibrantes. A sua qualidade de vida é excelente.
Como bem sabemos, a criatividade requer um ambiente que a estimule e que potencie uma ampla gama de estímulos sociais, culturais e económicos, estando, por isso, associada à ascensão de novos ambientes de trabalho, novos estilos de vida, novas organizações e espaços, ou seja, aos lugares criativos. É reconhecida a capacidade de certos lugares como impulsionadores da sua «Economia Criativa». Aliás, o carácter de um lugar é muitas vezes ensaiado e transmitido através dos produtos ou serviços mais ou menos criativos, mas as cidades/vilas têm um conteúdo fundamental: as pessoas, que são o seu maior recurso.
A inteligência humana, os desejos, aspirações, motivações, imaginação e criatividade estão a tomar o lugar da concentração de infra-estruturas, acesso ao mercado e localização de centros de decisão, enquanto recursos urbanos, por isso é que a criatividade daqueles que habitam e lideram uma cidade determina o seu futuro sucesso. Charles Landry, no seu “Creative City” (2000), já elencava como factores fundamentais para o desenvolvimento urbano, as capacidades humanas, a vontade e capacidade das lideranças, a diversidade humana e de talentos, a cultura de organização, a identidade local, os espaços urbanos e respectivas instalações e, finalmente, a trabalho em rede entre entes públicos e privados. Todos esses eixos têm um forte impacto no crescimento pessoal, na identidade e na imagem local e na qualidade de vida e no bem-estar da comunidade.
Contemplar a realidade criativa de uma cidade nos seus espaços (nas intervenções sobre o espaço público, no desenho urbano, na reabilitação urbana) numa óptica de planeamento contemporâneo pode providenciar as bases para a visão de uma nova cidade. Na verdade, na cidade criativa não são só os artistas e aqueles que estão envolvidos na «Economia Criativa» que são criativos. A criatividade pode vir de qualquer fonte, abrangendo todos aqueles que respondem a um problema de uma forma inventiva, seja um assistente social, um homem de negócios, um cientista ou um funcionário público. A cidade criativa percebe e integra as novas ferramentas da competitividade urbana: a capacidade das suas redes; a sua riqueza e profundidade cultural; a qualidade da sua administração; a consciência da importância do design urbano e a compreensão de como utilizar o seu conhecimento/história e a consciência ambiental.
Como nos ensina Charles Landry “Criatividade não é, apenas, a contínua descoberta da novidade, mas, também, a forma como lidamos convenientemente com o mais antigo”. Se é verdade que as cidades açorianas cumprem alguns dos requisitos de base para se dinamizarem como cidades criativas, Angra do Heroísmo tem valores e obrigações históricas acrescidas nessa matéria, e, quanto mais não seja, um futuro que a obriga a catalisar alternativas de desenvolvimento. Não conheço melhor tema para um programa eleitoral às eleições autárquicas de Outubro.
(1) http://www.charleslandry.com/index.php?l=interview
Nesta sequência, as cidades criativas, tal como desenhadas e perspectivadas, por Charles Landry (1), desde os anos 90, têm-se afirmado autênticas, informais, e vibrantes. A sua qualidade de vida é excelente.
Como bem sabemos, a criatividade requer um ambiente que a estimule e que potencie uma ampla gama de estímulos sociais, culturais e económicos, estando, por isso, associada à ascensão de novos ambientes de trabalho, novos estilos de vida, novas organizações e espaços, ou seja, aos lugares criativos. É reconhecida a capacidade de certos lugares como impulsionadores da sua «Economia Criativa». Aliás, o carácter de um lugar é muitas vezes ensaiado e transmitido através dos produtos ou serviços mais ou menos criativos, mas as cidades/vilas têm um conteúdo fundamental: as pessoas, que são o seu maior recurso.
A inteligência humana, os desejos, aspirações, motivações, imaginação e criatividade estão a tomar o lugar da concentração de infra-estruturas, acesso ao mercado e localização de centros de decisão, enquanto recursos urbanos, por isso é que a criatividade daqueles que habitam e lideram uma cidade determina o seu futuro sucesso. Charles Landry, no seu “Creative City” (2000), já elencava como factores fundamentais para o desenvolvimento urbano, as capacidades humanas, a vontade e capacidade das lideranças, a diversidade humana e de talentos, a cultura de organização, a identidade local, os espaços urbanos e respectivas instalações e, finalmente, a trabalho em rede entre entes públicos e privados. Todos esses eixos têm um forte impacto no crescimento pessoal, na identidade e na imagem local e na qualidade de vida e no bem-estar da comunidade.
Contemplar a realidade criativa de uma cidade nos seus espaços (nas intervenções sobre o espaço público, no desenho urbano, na reabilitação urbana) numa óptica de planeamento contemporâneo pode providenciar as bases para a visão de uma nova cidade. Na verdade, na cidade criativa não são só os artistas e aqueles que estão envolvidos na «Economia Criativa» que são criativos. A criatividade pode vir de qualquer fonte, abrangendo todos aqueles que respondem a um problema de uma forma inventiva, seja um assistente social, um homem de negócios, um cientista ou um funcionário público. A cidade criativa percebe e integra as novas ferramentas da competitividade urbana: a capacidade das suas redes; a sua riqueza e profundidade cultural; a qualidade da sua administração; a consciência da importância do design urbano e a compreensão de como utilizar o seu conhecimento/história e a consciência ambiental.
Como nos ensina Charles Landry “Criatividade não é, apenas, a contínua descoberta da novidade, mas, também, a forma como lidamos convenientemente com o mais antigo”. Se é verdade que as cidades açorianas cumprem alguns dos requisitos de base para se dinamizarem como cidades criativas, Angra do Heroísmo tem valores e obrigações históricas acrescidas nessa matéria, e, quanto mais não seja, um futuro que a obriga a catalisar alternativas de desenvolvimento. Não conheço melhor tema para um programa eleitoral às eleições autárquicas de Outubro.
(1) http://www.charleslandry.com/index.php?l=interview
domingo, janeiro 11, 2009
JÁ NÃO HÁ D.QUIXOTES?
Uma abordagem comprometida ao Federalismo epidérmico, ou como injustificar a (não) criação de Think Tanks/Centros de Estudo, hoje, nos Açores. Os Think Tanks são um fenómeno incontornável nas sociedades mais avançadas, que conseguem na sua versão mais pura enriquecer a governação e o debate público com as ideias baseadas em conhecimento e não em meras opiniões. Apresentam-se com as seguintes premissas: a) Organizações de carácter permanente; b) São especializadas na produção de soluções para as políticas públicas; c) Têm pessoal interno permanente dedicado à investigação; d) Produzem ideias, análises e recomendações; e) Dão grande ênfase à comunicação dos resultados do seu trabalho aos decisores políticos e opinião pública (internet); f) Não têm responsabilidades ao nível da governação; g) Não pretendem estar ao serviço de qualquer interesse específico: ambicionando independência para a sua pesquisa; h) Não oferecem graus académicos e a formação não é a sua actividade principal; i) Procuram agir, de forma explícita ou implícita, em benefício do interesse público (ver entre os melhores Notre Europe (1), Institute for Fiscal Studies (2), Brookings Institute (3), Cato Institute (4).
Nesta como em outras matérias se Portugal está na fase zero, SEDES (5), os Açores estarão na menos um. Uma sociedade civil “estruturalmente apática” (a que eu prefiro chamar de difusa) é, nas palavras de Constança Cunha e Sá (Revista Atlântico, Abril 2006), uma sociedade civil que, “ao contrário do que os liberais apregoam, não quer ser “libertada” de um Estado que a asfixia: quer que o Estado assegure a sua sobrevivência e garanta as suas justas necessidades”. As razões parecem óbvias e menos maquiavélicas do que alguns preferem fazer crer (e a presente conjuntura internacional só o vem reconfirmar): o Estado, no nosso caso, os órgãos de governo, redesenha-se não só para assegurar a coesão nacional/regional, como para responder às expectativas de uma classe média e de uma elite, económica ou intelectual, acomodadas e frágeis ao contexto global. Além disso, a sociedade açoriana dificilmente poderá encontrar condições para a formação de Think Tanks nos seus estados mais puros, seja ao nível do financiamento autónomo, seja porque tendo uma população reduzida, não faz “dispensar” pessoas apenas para a investigação. Ainda assim, pode tentar cumprir com a maioria dos restantes requisitos. Deve! A matéria-prima existe e sempre existiu: falo das ideias! Vejamos que os Think Tanks podem constituir-se como instrumentos fundamentais na maturidade da autonomia no processo democrático nacional, pois significam a passagem de uma fase de opiniões mediatizadas para a fase em que é o conhecimento a sustentar as decisões. Razões mais que muitas para a Região não poder dispensar esse caminho. Em diversos fora já se aflorou a necessidade de erigir uma fundação Antero de Quental, restaurando e desenvolvendo na Região a relevância do seu pensamento político-filosófico (o que até há pouco havia sido privilégio de alguns em Lisboa), em muitas outras intervenções tenho chamado à atenção para a obrigação de se criar um centro de estudos autonómicos comparados (Aristides Moreira da Mota), que justifique e sustente a dinâmica política e institucional da autonomia açoriana neste século XXI. Qualquer um deles poderia estar ligado à Assembleia Legislativa ou à Universidade dos Açores, qualquer um deles estaria habilitado em fazer uma ponte atlântica em matéria de pensamento. Finalmente, tornou-se, também, claro que os partidos, na Região, devem carregar esse tipo de obrigações, criando centros ou grupos de estudo que os sustentem nas suas tomadas de posição internas e a nível nacional. Dizem-me que os tempos mudam, mas as vontades parecem ter fenecido. Talvez, também, por isso, hoje, para muitos, bater no peito por um futuro estado federado pode continuar a parecer, simplesmente, quixotesco…
(1) http://www.notre-europe.asso.fr/sommaire.php3?lang=fr
(2) http://www.ifs.org.uk/
(3) http://www.brookings.org/
(4) http://www.asedes.org/
Ponta Delgada, 8 de Janeiro de 2009
Nesta como em outras matérias se Portugal está na fase zero, SEDES (5), os Açores estarão na menos um. Uma sociedade civil “estruturalmente apática” (a que eu prefiro chamar de difusa) é, nas palavras de Constança Cunha e Sá (Revista Atlântico, Abril 2006), uma sociedade civil que, “ao contrário do que os liberais apregoam, não quer ser “libertada” de um Estado que a asfixia: quer que o Estado assegure a sua sobrevivência e garanta as suas justas necessidades”. As razões parecem óbvias e menos maquiavélicas do que alguns preferem fazer crer (e a presente conjuntura internacional só o vem reconfirmar): o Estado, no nosso caso, os órgãos de governo, redesenha-se não só para assegurar a coesão nacional/regional, como para responder às expectativas de uma classe média e de uma elite, económica ou intelectual, acomodadas e frágeis ao contexto global. Além disso, a sociedade açoriana dificilmente poderá encontrar condições para a formação de Think Tanks nos seus estados mais puros, seja ao nível do financiamento autónomo, seja porque tendo uma população reduzida, não faz “dispensar” pessoas apenas para a investigação. Ainda assim, pode tentar cumprir com a maioria dos restantes requisitos. Deve! A matéria-prima existe e sempre existiu: falo das ideias! Vejamos que os Think Tanks podem constituir-se como instrumentos fundamentais na maturidade da autonomia no processo democrático nacional, pois significam a passagem de uma fase de opiniões mediatizadas para a fase em que é o conhecimento a sustentar as decisões. Razões mais que muitas para a Região não poder dispensar esse caminho. Em diversos fora já se aflorou a necessidade de erigir uma fundação Antero de Quental, restaurando e desenvolvendo na Região a relevância do seu pensamento político-filosófico (o que até há pouco havia sido privilégio de alguns em Lisboa), em muitas outras intervenções tenho chamado à atenção para a obrigação de se criar um centro de estudos autonómicos comparados (Aristides Moreira da Mota), que justifique e sustente a dinâmica política e institucional da autonomia açoriana neste século XXI. Qualquer um deles poderia estar ligado à Assembleia Legislativa ou à Universidade dos Açores, qualquer um deles estaria habilitado em fazer uma ponte atlântica em matéria de pensamento. Finalmente, tornou-se, também, claro que os partidos, na Região, devem carregar esse tipo de obrigações, criando centros ou grupos de estudo que os sustentem nas suas tomadas de posição internas e a nível nacional. Dizem-me que os tempos mudam, mas as vontades parecem ter fenecido. Talvez, também, por isso, hoje, para muitos, bater no peito por um futuro estado federado pode continuar a parecer, simplesmente, quixotesco…
(1) http://www.notre-europe.asso.fr/sommaire.php3?lang=fr
(2) http://www.ifs.org.uk/
(3) http://www.brookings.org/
(4) http://www.asedes.org/
Ponta Delgada, 8 de Janeiro de 2009
domingo, dezembro 28, 2008
NATAL UP-TO-DATE
Em vez da consoada há um baile de máscaras
Na filial do Banco erigiu-se um Presépio
Todos estes pastores são jovens tecnocratas
que usarão dominó já na próxima década
Chega o rei do petróleo a fingir de Rei Mago
Chega o rei do barulho e conserva-se mudo
enquanto se não sabe ao certo o resultado
dos que vêm sondar a reacção do público
Nas palhas do curral ocultam-se microfones
O lajedo em redor é de pedras da lua
Rainhas de beleza hão-de vir de helicóptero
e é provável até que se apresentem nuas
Eis que surge do céu a estrela prometida
Mas é para apontar mais um supermercado
onde se vende pão já transformado em cinza
para que o ritual seja muito mais rápido
Assim a noite passa e passa tão depressa
que a meia-noite em vós nem se demora um pouco
Só Jesus no entanto é que não comparece
Só Jesus afinal não quer nada convosco
David Mourão-Ferreira
Na filial do Banco erigiu-se um Presépio
Todos estes pastores são jovens tecnocratas
que usarão dominó já na próxima década
Chega o rei do petróleo a fingir de Rei Mago
Chega o rei do barulho e conserva-se mudo
enquanto se não sabe ao certo o resultado
dos que vêm sondar a reacção do público
Nas palhas do curral ocultam-se microfones
O lajedo em redor é de pedras da lua
Rainhas de beleza hão-de vir de helicóptero
e é provável até que se apresentem nuas
Eis que surge do céu a estrela prometida
Mas é para apontar mais um supermercado
onde se vende pão já transformado em cinza
para que o ritual seja muito mais rápido
Assim a noite passa e passa tão depressa
que a meia-noite em vós nem se demora um pouco
Só Jesus no entanto é que não comparece
Só Jesus afinal não quer nada convosco
David Mourão-Ferreira
domingo, dezembro 14, 2008
AÇORES POSITIVOS
Qualquer concidadão que queira resistir à onda depressiva que, diariamente, nos invade nos jornais, rádios e televisões vê a sua luta consumir-lhe, não só, a maioria das energias disponíveis. Não falamos apenas da capacidade de filtragem entre o que é notícia e diagnóstico e o que é especulação ou demagogia, mas também na preocupação de qualquer cidadão de corpo inteiro em querer encontrar um fio condutor, um lampejo de estratégia, uma propositura clarividente, em suma, uma garantia de futuro.
Ora, ainda que a esmagadora maioria das preocupações, que, militantemente, não desistem de nos trazer, são com o presente, nenhum de nós, cidadãos, jornalistas, peritos ou políticos poderá ou deverá cruzar os braços e deixar de olhar em frente.
Na verdade, se é legítimo, além de fundamental, que se façam os diagnósticos, nas causas e consequências, da complexa conjuntura internacional, nacional e regional que enfrentamos, não será menos legítimo, antes aparece reforçada, a necessidade de apresentação e constante busca de soluções para os desafios emergentes.
Ou seja, circunscrever um discurso, seja em que contexto for, às causas e consequências e nunca avançar para as soluções e, sobretudo, para as oportunidades que se abrem é ter uma visão coartada, mesmo menor, do papel que cada um pode desempenhar neste projecto colectivo que é viver nos Açores do século XXI. E, neste empenho, tanto se devem destacar as entidades públicas como as privadas. As primeiras, por obrigação, mercê do contrato social legitimado nas urnas, as segundas, porque não se podem esgotar no lucro, reclamando-se-lhes uma consequente responsabilidade social, enquanto parceiro e objecto do desenvolvimento regional.
Por isso, e para descanso da alma, não quero deixar de concluir estas linhas sem apontar dois exemplos, muito recentes, do que podem, e devem, ser as estratégias e as prioridades nos Açores, ao nível da intervenção pública e da dinâmica privada.
A Câmara Municipal da Horta vai estender a rede sem fios a todas as freguesias do concelho, proporcionado o acesso gratuito à Internet para os cerca de 15 mil habitantes da ilha do Faial. Entretanto, algumas Juntas de Freguesia da ilha já começaram a adquirir os equipamentos necessários para instalar a rede wireless.
Vinte e dois projectos disputaram a edição deste ano do Concurso Regional de Empreendedorismo. Em primeiro lugar ficou classificado o projecto “Criolabaçores”, que tem por objectivo a criação do primeiro banco de sangue de cordão umbilical a oferecer colheita, transporte, processamento e isolamento e criopreservação de células estaminais.
Resumindo, e para os que tudo resumem na palavra crise, digo que preocupado ficarei se houver crise de ideias, de estratégias ou de vontades, porque não esqueço que aquele conceito quer significar, também, pela sua etimologia (do grego Krísis), um momento decisivo, uma emergência, um risco, mas, simultaneamente, uma oportunidade…
Ponta Delgada, 10 de Dezembro de 2008
Ora, ainda que a esmagadora maioria das preocupações, que, militantemente, não desistem de nos trazer, são com o presente, nenhum de nós, cidadãos, jornalistas, peritos ou políticos poderá ou deverá cruzar os braços e deixar de olhar em frente.
Na verdade, se é legítimo, além de fundamental, que se façam os diagnósticos, nas causas e consequências, da complexa conjuntura internacional, nacional e regional que enfrentamos, não será menos legítimo, antes aparece reforçada, a necessidade de apresentação e constante busca de soluções para os desafios emergentes.
Ou seja, circunscrever um discurso, seja em que contexto for, às causas e consequências e nunca avançar para as soluções e, sobretudo, para as oportunidades que se abrem é ter uma visão coartada, mesmo menor, do papel que cada um pode desempenhar neste projecto colectivo que é viver nos Açores do século XXI. E, neste empenho, tanto se devem destacar as entidades públicas como as privadas. As primeiras, por obrigação, mercê do contrato social legitimado nas urnas, as segundas, porque não se podem esgotar no lucro, reclamando-se-lhes uma consequente responsabilidade social, enquanto parceiro e objecto do desenvolvimento regional.
Por isso, e para descanso da alma, não quero deixar de concluir estas linhas sem apontar dois exemplos, muito recentes, do que podem, e devem, ser as estratégias e as prioridades nos Açores, ao nível da intervenção pública e da dinâmica privada.
A Câmara Municipal da Horta vai estender a rede sem fios a todas as freguesias do concelho, proporcionado o acesso gratuito à Internet para os cerca de 15 mil habitantes da ilha do Faial. Entretanto, algumas Juntas de Freguesia da ilha já começaram a adquirir os equipamentos necessários para instalar a rede wireless.
Vinte e dois projectos disputaram a edição deste ano do Concurso Regional de Empreendedorismo. Em primeiro lugar ficou classificado o projecto “Criolabaçores”, que tem por objectivo a criação do primeiro banco de sangue de cordão umbilical a oferecer colheita, transporte, processamento e isolamento e criopreservação de células estaminais.
Resumindo, e para os que tudo resumem na palavra crise, digo que preocupado ficarei se houver crise de ideias, de estratégias ou de vontades, porque não esqueço que aquele conceito quer significar, também, pela sua etimologia (do grego Krísis), um momento decisivo, uma emergência, um risco, mas, simultaneamente, uma oportunidade…
Ponta Delgada, 10 de Dezembro de 2008