ABSTENCIONISTAS UNIDOS
“Éramos mandados, somos governados.” Socorro-me de Antero de Quental quando numa das suas mais constantes bandeiras reconhecia que “persiste a inércia política das populações, a necessidade (e o gosto, talvez) de que as governem” (1).
De novo pasmos ou indignados com os valores da abstenção eleitoral na Região. Desta vez, chegou aos 70,5% baixando apenas 2,4%, em relação a 98, quando no todo nacional desceu 12%. Dizer que a abstenção técnica (cadernos desactualizados) tem muita culpa é «tapar o sol com a peneira». Através dos números, comparando o exercício do voto nas regionais, autárquicas e nacionais, tornou-se, para mim, claro que os eleitores açorianos não estão, minimamente, mobilizados para as eleições nacionais. Se alguém se der ao trabalho de confirmar os resultados desde 1998 (última grande actualização dos cadernos) a abstenção na Região em actos eleitorais de âmbito nacional nunca baixou os 50%: Nacionais (1999 – 49,7%; 2002 – 51,9%; 2005 – 51,8%), Presidenciais (2001 – 62, 8%; 2006 – 56,9%), Europeias (1999 – 69,1%; 2004 – 69,4%), Referendos (1998 – 72,9%; 2007 – 70,5%). Não me digam que não temos aqui um problema!?! A Região está, consecutivamente, a ter as maiores taxas do país. Mais se consegue dizer que incide, sobretudo, nos mais jovens. A tese da distância e do «merecíamos políticos melhores», que continuo a não subscrever, é indício de uma desresponsabilização colectiva. O «abstencionismo unido» posiciona-se como ponte para a auto-exclusão. A não-participação é a periferia da decisão. Urge a mudança. É certo que a «nova cidadania» não se institui por decreto, nem é instantânea, não obstante devemos cuidar do legado democrático às gerações vindouras. Será demagógico fazer projecções sobre a democracia futura, tanto mais pelos desafios globais que, diariamente, nos tocam, mas, sempre, vale a pena repetir um conjunto de verdades pacíficas que podem consolidar o exercício da cidadania.
Agilizar e normalizar, socialmente, o exercício dos diversos instrumentos de participação democrática directa: os referendos regionais e, sobretudo, locais; as petições e as iniciativas legislativas populares. Procurar o «associativismo para a propositura», que se inscreva na realidade colectiva, informe, questione, proponha e contra-proponha.
Reforçar a ética no funcionamento do sistema político: o regime de suspensão, substituição e exercício dos mandatos, as incompatibilidades, os registos de interesse, os mecanismos independentes de supervisão, controlo e disciplina que funcionem de forma transparente, isenta e célere, os sistemas de queixa pública e o recurso às novas tecnologias de informação e comunicação para o seu efeito.
Inovar os partidos políticos, superar as oligarquias e o monopólio partidário na representatividade parlamentar: as tecnologias para maior transparência na organização e financiamento dos partidos; o esforço de renovação e formação das elites dirigentes, a representatividade plural das novas clivagens sociais, o espaço para a geração on-line; a desburocratização de estruturas e organizações intermédias, o fomento do debate intrapartidário e a permeabilização às novas temáticas.
Uma formação cívica e educação política global para os jovens: a oferta curricular de línguas estrangeiras e de história mundial, o aproveitamento de instrumentos de mobilidade e intercâmbio internacional, o desenhar de programas de participação/intervenção de jovens e escolas ao nível local e regional, o aumento do investimento em investigação, desenvolvimento e formação para a informação e liberdade de expressão (2).
Só à não democracia convém uma sociedade ignorante e com baixos níveis de intervenção cívica. Uma sociedade bem formada torna-se numa sociedade exigente perante o sistema político. É esta a regra de ouro. Estamos, no entanto, conscientes que na ausência de uma expressa vontade política de romper com o passado todas estas linhas não passarão de mais um exercício visionário.
(1) In Causas da Decadência dos Povos Peninsulares. 8.ª Edição - Ed. Ulmeiro, 2001
(2) Ver “Política e Participação”, Luís de Sousa. In, 20 ideias para 2020 – Inovar Portugal. Ed. Campo das Letras, 2006
Sé, 12 de Fevereiro de 2007
De novo pasmos ou indignados com os valores da abstenção eleitoral na Região. Desta vez, chegou aos 70,5% baixando apenas 2,4%, em relação a 98, quando no todo nacional desceu 12%. Dizer que a abstenção técnica (cadernos desactualizados) tem muita culpa é «tapar o sol com a peneira». Através dos números, comparando o exercício do voto nas regionais, autárquicas e nacionais, tornou-se, para mim, claro que os eleitores açorianos não estão, minimamente, mobilizados para as eleições nacionais. Se alguém se der ao trabalho de confirmar os resultados desde 1998 (última grande actualização dos cadernos) a abstenção na Região em actos eleitorais de âmbito nacional nunca baixou os 50%: Nacionais (1999 – 49,7%; 2002 – 51,9%; 2005 – 51,8%), Presidenciais (2001 – 62, 8%; 2006 – 56,9%), Europeias (1999 – 69,1%; 2004 – 69,4%), Referendos (1998 – 72,9%; 2007 – 70,5%). Não me digam que não temos aqui um problema!?! A Região está, consecutivamente, a ter as maiores taxas do país. Mais se consegue dizer que incide, sobretudo, nos mais jovens. A tese da distância e do «merecíamos políticos melhores», que continuo a não subscrever, é indício de uma desresponsabilização colectiva. O «abstencionismo unido» posiciona-se como ponte para a auto-exclusão. A não-participação é a periferia da decisão. Urge a mudança. É certo que a «nova cidadania» não se institui por decreto, nem é instantânea, não obstante devemos cuidar do legado democrático às gerações vindouras. Será demagógico fazer projecções sobre a democracia futura, tanto mais pelos desafios globais que, diariamente, nos tocam, mas, sempre, vale a pena repetir um conjunto de verdades pacíficas que podem consolidar o exercício da cidadania.
Agilizar e normalizar, socialmente, o exercício dos diversos instrumentos de participação democrática directa: os referendos regionais e, sobretudo, locais; as petições e as iniciativas legislativas populares. Procurar o «associativismo para a propositura», que se inscreva na realidade colectiva, informe, questione, proponha e contra-proponha.
Reforçar a ética no funcionamento do sistema político: o regime de suspensão, substituição e exercício dos mandatos, as incompatibilidades, os registos de interesse, os mecanismos independentes de supervisão, controlo e disciplina que funcionem de forma transparente, isenta e célere, os sistemas de queixa pública e o recurso às novas tecnologias de informação e comunicação para o seu efeito.
Inovar os partidos políticos, superar as oligarquias e o monopólio partidário na representatividade parlamentar: as tecnologias para maior transparência na organização e financiamento dos partidos; o esforço de renovação e formação das elites dirigentes, a representatividade plural das novas clivagens sociais, o espaço para a geração on-line; a desburocratização de estruturas e organizações intermédias, o fomento do debate intrapartidário e a permeabilização às novas temáticas.
Uma formação cívica e educação política global para os jovens: a oferta curricular de línguas estrangeiras e de história mundial, o aproveitamento de instrumentos de mobilidade e intercâmbio internacional, o desenhar de programas de participação/intervenção de jovens e escolas ao nível local e regional, o aumento do investimento em investigação, desenvolvimento e formação para a informação e liberdade de expressão (2).
Só à não democracia convém uma sociedade ignorante e com baixos níveis de intervenção cívica. Uma sociedade bem formada torna-se numa sociedade exigente perante o sistema político. É esta a regra de ouro. Estamos, no entanto, conscientes que na ausência de uma expressa vontade política de romper com o passado todas estas linhas não passarão de mais um exercício visionário.
(1) In Causas da Decadência dos Povos Peninsulares. 8.ª Edição - Ed. Ulmeiro, 2001
(2) Ver “Política e Participação”, Luís de Sousa. In, 20 ideias para 2020 – Inovar Portugal. Ed. Campo das Letras, 2006
Sé, 12 de Fevereiro de 2007
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