É A GEOGRAFIA, ESTÚPIDO!
Já Nemésio dizia que a Geografia para nós valia outro tanto como a História (1). E essa verdade não se esgota na caracterização sócio-cultural. Analisando a importância do factor geográfico na definição das políticas públicas, das relações institucionais e na construção de uma realidade regional coesa política, social e economicamente, verificamos que, do século XIX onde “a geografia, a economia e a organização político-administrativa não tinham possibilitado que se forjasse nos Açores uma entidade regional coerente e autónoma” (2) ao pós 1976, que não fugiu ao determinismo geográfico, em aliança ao histórico, como critério fundador do edifício institucional autonómico, não houve como contornar o «chauvinismo» das ilhas e criar uma consciência regional. Para esta, já Silva Ribeiro defendia na sociedade duas ordens de factores: “uma profunda, que constitui como que alicerce do edifício social – a organização e actividade económica; outra envolvente, superficial, que por aquela se molda – a organização político-administrativa” (3).
Económica e socialmente a autonomia constitucional cresce à sombra do desenvolvimento harmónico (que ainda reside o Estatuto Político-Administrativo) um conceito que tem no seu âmago a geografia enquanto factor primeiro no desenvolvimento das políticas públicas para as 9 ilhas, de modo que estas tornavam-se, em si, sujeitos automáticos de todas as orientações garantindo-lhes o acesso a fundos, ou a estruturas, independentemente das suas reais necessidades.
Aqui, os novos tempos trazem-nos uma mudança do paradigma pelo conceito do desenvolvimento integrado, que as políticas de coesão, e para a coesão, impõem, ao interpretarem o factor geográfico conjuntamente com outros factores (sociais, ambientais e económicos). Perspectivando as ilhas nas suas realidades próprias, construir-se-ão e desenhar-se-ão as políticas públicas mais adequadas, e ao desenvolvimento de cada uma ligar-se-ão políticas regionais incentivando a circulação de bens, pessoas e serviços ajudando à criação de um mercado interno e ao acesso aos mercados externos.
O redireccionamento dos recursos regionais para potenciação das idiossincrasias das ilhas e menos para consolo de nomenclaturas ou clientelas imobilistas, faz-nos aterrar, de novo, no pilar sociológico. O «velho», mas sempre viçoso, bairrismo. Fomentado ao longo dos séculos, primeiro, pela natureza, depois, pelas estruturas administrativas públicas, não foram estes últimos 30 anos que o esbateram, eventualmente até nele tiveram contribuição. As ilhas viveram em competição directa ao longo de demasiados anos, originando invejas, que se transmitiram de geração em geração, consumindo recursos. O bairrismo só se esbaterá pela satisfação pessoal. Não por políticas soviéticas, idênticas e formatadas, mas pelo empreendedorismo individual, pela criação de riqueza e de livre acesso aos bens e serviços em cada ilha. Mas se, como vimos, há políticas que convergem para essa superação, o seu último reduto encontra-se no edifício político-institucional onde as estruturas político-partidárias não cuidam de garantir, pelo menos, a sua mitigação. É um facto indesmentível que o século XXI contesta a realidade de apenas 3 ilhas encerrarem todo o modelo institucional da autonomia. Os novos modelos organizacionais aliados às novas tecnologias estilhaçam esse arcaísmo. A perspectiva institucional deve assegurar, no seu princípio e no seu fim, a consciência e o discurso regional. Por exemplo: se a construção inicial da lei eleitoral regional procurou o equilíbrio do factor geográfico (ilhas) promovendo distorções de proporcionalidade, representatividade e legitimidade política, agora, pela criação de um sistema misto, com um círculo regional, contribui-se para o ponto óptimo de uma visão política regional aliada às necessidades de proximidade eleitor-eleito.
Será o desafio que falta vencer e é o desafio político para este século: fomentar na estruturação institucional, territorial, partidária, económica e social regional factores onde haja menos rua, freguesia, concelho, ilha, mais consciência e discurso regional, mas sobretudo mais Região no Mundo e Mundo na Região. É essa a nossa geografia.
(1) Açorianidade. Insula n.º 7-8. Julho-Agosto, 1932
(2) Maria Isabel João, Os Açores no Século XIX, Economia, Sociedade e Movimentos Autonomistas. Ed. Cosmos, 1991.
(3) Obras, Vol. IV – Escritos Político-Administrativos. Ed. Instituto Histórico da Ilha Terceira, 1996
Horta, 20 de Novembro de 06
Económica e socialmente a autonomia constitucional cresce à sombra do desenvolvimento harmónico (que ainda reside o Estatuto Político-Administrativo) um conceito que tem no seu âmago a geografia enquanto factor primeiro no desenvolvimento das políticas públicas para as 9 ilhas, de modo que estas tornavam-se, em si, sujeitos automáticos de todas as orientações garantindo-lhes o acesso a fundos, ou a estruturas, independentemente das suas reais necessidades.
Aqui, os novos tempos trazem-nos uma mudança do paradigma pelo conceito do desenvolvimento integrado, que as políticas de coesão, e para a coesão, impõem, ao interpretarem o factor geográfico conjuntamente com outros factores (sociais, ambientais e económicos). Perspectivando as ilhas nas suas realidades próprias, construir-se-ão e desenhar-se-ão as políticas públicas mais adequadas, e ao desenvolvimento de cada uma ligar-se-ão políticas regionais incentivando a circulação de bens, pessoas e serviços ajudando à criação de um mercado interno e ao acesso aos mercados externos.
O redireccionamento dos recursos regionais para potenciação das idiossincrasias das ilhas e menos para consolo de nomenclaturas ou clientelas imobilistas, faz-nos aterrar, de novo, no pilar sociológico. O «velho», mas sempre viçoso, bairrismo. Fomentado ao longo dos séculos, primeiro, pela natureza, depois, pelas estruturas administrativas públicas, não foram estes últimos 30 anos que o esbateram, eventualmente até nele tiveram contribuição. As ilhas viveram em competição directa ao longo de demasiados anos, originando invejas, que se transmitiram de geração em geração, consumindo recursos. O bairrismo só se esbaterá pela satisfação pessoal. Não por políticas soviéticas, idênticas e formatadas, mas pelo empreendedorismo individual, pela criação de riqueza e de livre acesso aos bens e serviços em cada ilha. Mas se, como vimos, há políticas que convergem para essa superação, o seu último reduto encontra-se no edifício político-institucional onde as estruturas político-partidárias não cuidam de garantir, pelo menos, a sua mitigação. É um facto indesmentível que o século XXI contesta a realidade de apenas 3 ilhas encerrarem todo o modelo institucional da autonomia. Os novos modelos organizacionais aliados às novas tecnologias estilhaçam esse arcaísmo. A perspectiva institucional deve assegurar, no seu princípio e no seu fim, a consciência e o discurso regional. Por exemplo: se a construção inicial da lei eleitoral regional procurou o equilíbrio do factor geográfico (ilhas) promovendo distorções de proporcionalidade, representatividade e legitimidade política, agora, pela criação de um sistema misto, com um círculo regional, contribui-se para o ponto óptimo de uma visão política regional aliada às necessidades de proximidade eleitor-eleito.
Será o desafio que falta vencer e é o desafio político para este século: fomentar na estruturação institucional, territorial, partidária, económica e social regional factores onde haja menos rua, freguesia, concelho, ilha, mais consciência e discurso regional, mas sobretudo mais Região no Mundo e Mundo na Região. É essa a nossa geografia.
(1) Açorianidade. Insula n.º 7-8. Julho-Agosto, 1932
(2) Maria Isabel João, Os Açores no Século XIX, Economia, Sociedade e Movimentos Autonomistas. Ed. Cosmos, 1991.
(3) Obras, Vol. IV – Escritos Político-Administrativos. Ed. Instituto Histórico da Ilha Terceira, 1996
Horta, 20 de Novembro de 06
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