OBJECTIVO: EUROPA
"A Europa jaz, posta nos cotovelos:
De Oriente a Ocidente jaz, fitando,
E toldam-lhe românticos cabelos
Olhos gregos, lembrando.
O cotovelo esquerdo é recuado;
O direito é em ângulo disposto.
Aquele diz Itália onde é pousado;
Este diz Inglaterra onde, afastado,
A mão sustenta, em que se apoia o rosto.
Fita, com olhar 'sfíngico e fatal,
O Ocidente, futuro do passado.
O rosto com que fita é Portugal."
Fernando Pessoa, In Mensagem - I - Os Campos - Primeiro - O dos Castelos
Pessoa não poderia adivinhar. À terceira vai ser de vez. Damos nome ao Tratado da União Europeia depois de lhe ter dado uma Estratégia. Portugal no grupo dos pequenos? Pensavam vocês eurocépticos! Não importa que o rosto da Europa já não olhe o Ocidente (mesmo querendo o Brasil, mesmo abraçando África e o Atlântico). Agora, o rosto que fita está mandatado para olhar o umbigo. E que lindo é! Também, olha, por cima do ombro, em direcção a Oriente (o medo obriga). O rosto da Europa carrega o peso do meirinho na transcrição da sentença. O rosto com 800 anos de História reservou-se ao papel de manga de alpaca. Resta-lhe aparecer aprumado, fresco, moderno até. Tecnológico, sobretudo. E o Tratado (reformado, reformador, menos mini e mais maxi, mas, hélas, não constitucional) será tratado (redundância propositada) com polé. Não se agitem, sosseguem concidadãos europeístas convictos (ou mesmo os nem por isso), o objectivo fixado de “uma economia do conhecimento mais competitiva e dinâmica do mundo, capaz de um crescimento económico sustentável e de uma melhoria qualitativa e quantitativa nas políticas de emprego e de coesão social” (Lisboa – a outra - a estratégica), fica mais próximo. Falemos de flexisegurança, de concorrência, de dumping social, de combate a políticas neo-liberais. Falemos de eurocracia. Não falemos de soberania, de unanimidades, maiorias qualificadas e maiorias simples. Não falemos de Presidentes, dos altos, ou baixos, comissários ou do opting-out. Não falemos da Turquia. Não falemos do medo (outro e mais profundo) que o cidadão sente e das dúvidas que o assaltam de que a União continue a não estar preparada para os desafios da globalização e seja capaz de prosseguir políticas que obtenham resultados que se façam sentir na vida quotidiana. Falemos das bandeiras e dos hinos que não foram. Não falemos da desconfiança. Não falemos de aprofundar fórmulas de cidadania europeia. Não falemos da participação e do esclarecimento. Ainda não falemos do referendo. Não falemos de política. Não falemos de democracia. Não falemos da Europa. Não falemos, não importa, o Tratado será de…Lisboa! E, isso, pelo menos, garantem-me, já não nos poderão tirar (cruzes, canhoto!).
Sé, 2 de Julho de 2007
<< Home