O SISTEMA
Sejamos claros, uma análise política ao sistema eleitoral dos Açores só pode ser globalmente favorável. A opção pela representatividade das ilhas, num primeiro momento, a que se juntou a deliberada intenção de dar menor peso às ilhas maiores na ponderação global, foram um decisivo passo para a coesão e identificação arquipelágica. Convém não esquecer que até à autonomia constitucional o crescimento insular foi feito contra esta perspectiva, por oposição natural e imposição administrativa. Além disso, a exclusão de um círculo único regional garantiu às ilhas aquilo que podia ficar nas mãos dos directórios partidários, ou seja, a efectiva representatividade no parlamento regional. Sendo assim, as perguntas que, naturalmente, surgem são: Para quê mudar? E mudar o quê?
Os pareceres políticos chegados à assembleia foram unânimes na aprovação do actual modelo, os pareceres técnicos revelaram que o há muito se sabia, e que esteve quase a acontecer em 1996, a proporcionalidade global do sistema está desvirtuada pela sobre-presentatividade das ilhas menos populosas ao ponto de ser possível o partido mais votado não ter maior representação parlamentar originando um impasse na legitimidade democrática. Das manifestações públicas, dos intervenientes directos no processo, entretanto recolhidas, podemos concluir, mais claramente, que o PS opta por uma proposta que assenta na criação de um décimo círculo de apuramento regional com 5 deputados, e menos claramente, que o PSD opta por trabalhar as parcelas da representatividade relativa das ilhas. Há diferença?
Na minha modesta opinião, e com grano salis, o PS, com a sua proposta, ataca o cerne da questão resolvendo a proporcionalidade global do sistema e garantido em qualquer cenário que o partido mais votado seja o mais representado. O PSD melhorando a representatividade parcelar (fazendo justiça às ilhas mais populosas) não obsta a que a entorse natural, o peso das ilhas mais pequenas, continue a fazer perigar a proporcionalidade do sistema (isto quer opte, simplesmente, por aumentar a representação em São Miguel ou Terceira, quer decida diminuir a representação directa das restantes ilhas).
Também a favor do projecto do PS haverá quer a evidente projecção global dos partidos pequenos que, para a sua sobrevivência, deixarão de ser manifestações locais voláteis ao decurso do tempo, quer a garantia de pluralidade democrática no sistema político regional (PCP e CDS/PP teriam claramente garantidos assentos parlamentares dentro actuais dos volumes de votação).
Entretanto, anexas a estas propostas poderão surgir novas questões, umas mais relevantes que outras.
As pretensas questões de se estarem a criar deputados de primeira ou de segunda ou de que os deputados eleitos pelo círculo regional do PS não «respondem» perante um eleitorado concreto, são ilusórias. Quero lembrar aos «velhos do Restelo», que o próprio Estatuto ao considerar, após a tomada de posse, todos os deputados como regionais ancora a referência de qualquer deputado não na sua ilha mas no arquipélago.
Contudo, como consequência directa de qualquer das alterações (do PS ou do PSD) poderá haver um aumento do número de parlamentares na Assembleia Legislativa. E, agora, uma nova e consciente pergunta se perfila no horizonte: É necessário aumentar o número de deputados quando o mesmo efeito pode ser atingido com a sua diminuição? Não posso deixar de lembrar que os Açores possam estar a trabalhar em números acima dos 60 deputados quando a Madeira já tem uma imposição constitucional que os limitará a 47 em 2008. Causam-me alguns engulhos que a Região querendo resolver um problema (e precisa resolvê-lo) avance na perspectiva menos onerosa a curto prazo. O cerne da questão deveria, aqui, ser: Queremos menos, melhores e mais bem remunerados deputados? Consensos precisam-se. Atentemos, por exemplo, outra matéria sem a qual qualquer abordagem ao sistema eleitoral é um mero exercício formal. Trata-se da necessidade de actualização dos cadernos eleitorais que, na Região, estão, mais uma vez, a dar uma dimensão ao sistema incompatível com a realidade. Se perante as opções sistémicas apresentadas se optar por uma reestruturação das fracções eleitorais nos círculos por ilha, não faz qualquer sentido promover essa mudança sem que um trabalho de limpeza, entretanto interrompido pelo STAPE em 1998, não seja contínua e afincadamente prosseguido. E, porque não são os departamentos da administração central que nos dão garantias de sucesso nesse campo, o apelo que não posso deixar de fazer é para que seja a Região a assumir esse desiderato. Um pacto de regime aqui, mais do que em outra questão, é necessário, bem sabemos que em algumas ilhas a sobre-representação se pode ficar a dever a mais factores do que o sistema eleitoral, bem sabemos que o Fundo de Financiamento das Freguesias (participações financeiras para as freguesias provindas do Orçamento de Estado) é determinado pelo número de recenseados, bem sabemos que algumas freguesias (mesmo a mais recentes) perderão a sua sustentabilidade política e financeira. Talvez sejam estas as nuances que perpassam no pensamento dos líderes partidários regionais quando apelam à obtenção de consensos, e é por isso que estas palavras poderão constituir, mais do que o desafio de um sistema, um desafio ao sistema.
A todos Votos de um Santo Natal e Próspero 2005.
Postits (http://chaverde.blogspot.com/).
Sé, Angra do Heroísmo, 17 de Dezembro de 2004
Guilherme Tavares Marinho
Os pareceres políticos chegados à assembleia foram unânimes na aprovação do actual modelo, os pareceres técnicos revelaram que o há muito se sabia, e que esteve quase a acontecer em 1996, a proporcionalidade global do sistema está desvirtuada pela sobre-presentatividade das ilhas menos populosas ao ponto de ser possível o partido mais votado não ter maior representação parlamentar originando um impasse na legitimidade democrática. Das manifestações públicas, dos intervenientes directos no processo, entretanto recolhidas, podemos concluir, mais claramente, que o PS opta por uma proposta que assenta na criação de um décimo círculo de apuramento regional com 5 deputados, e menos claramente, que o PSD opta por trabalhar as parcelas da representatividade relativa das ilhas. Há diferença?
Na minha modesta opinião, e com grano salis, o PS, com a sua proposta, ataca o cerne da questão resolvendo a proporcionalidade global do sistema e garantido em qualquer cenário que o partido mais votado seja o mais representado. O PSD melhorando a representatividade parcelar (fazendo justiça às ilhas mais populosas) não obsta a que a entorse natural, o peso das ilhas mais pequenas, continue a fazer perigar a proporcionalidade do sistema (isto quer opte, simplesmente, por aumentar a representação em São Miguel ou Terceira, quer decida diminuir a representação directa das restantes ilhas).
Também a favor do projecto do PS haverá quer a evidente projecção global dos partidos pequenos que, para a sua sobrevivência, deixarão de ser manifestações locais voláteis ao decurso do tempo, quer a garantia de pluralidade democrática no sistema político regional (PCP e CDS/PP teriam claramente garantidos assentos parlamentares dentro actuais dos volumes de votação).
Entretanto, anexas a estas propostas poderão surgir novas questões, umas mais relevantes que outras.
As pretensas questões de se estarem a criar deputados de primeira ou de segunda ou de que os deputados eleitos pelo círculo regional do PS não «respondem» perante um eleitorado concreto, são ilusórias. Quero lembrar aos «velhos do Restelo», que o próprio Estatuto ao considerar, após a tomada de posse, todos os deputados como regionais ancora a referência de qualquer deputado não na sua ilha mas no arquipélago.
Contudo, como consequência directa de qualquer das alterações (do PS ou do PSD) poderá haver um aumento do número de parlamentares na Assembleia Legislativa. E, agora, uma nova e consciente pergunta se perfila no horizonte: É necessário aumentar o número de deputados quando o mesmo efeito pode ser atingido com a sua diminuição? Não posso deixar de lembrar que os Açores possam estar a trabalhar em números acima dos 60 deputados quando a Madeira já tem uma imposição constitucional que os limitará a 47 em 2008. Causam-me alguns engulhos que a Região querendo resolver um problema (e precisa resolvê-lo) avance na perspectiva menos onerosa a curto prazo. O cerne da questão deveria, aqui, ser: Queremos menos, melhores e mais bem remunerados deputados? Consensos precisam-se. Atentemos, por exemplo, outra matéria sem a qual qualquer abordagem ao sistema eleitoral é um mero exercício formal. Trata-se da necessidade de actualização dos cadernos eleitorais que, na Região, estão, mais uma vez, a dar uma dimensão ao sistema incompatível com a realidade. Se perante as opções sistémicas apresentadas se optar por uma reestruturação das fracções eleitorais nos círculos por ilha, não faz qualquer sentido promover essa mudança sem que um trabalho de limpeza, entretanto interrompido pelo STAPE em 1998, não seja contínua e afincadamente prosseguido. E, porque não são os departamentos da administração central que nos dão garantias de sucesso nesse campo, o apelo que não posso deixar de fazer é para que seja a Região a assumir esse desiderato. Um pacto de regime aqui, mais do que em outra questão, é necessário, bem sabemos que em algumas ilhas a sobre-representação se pode ficar a dever a mais factores do que o sistema eleitoral, bem sabemos que o Fundo de Financiamento das Freguesias (participações financeiras para as freguesias provindas do Orçamento de Estado) é determinado pelo número de recenseados, bem sabemos que algumas freguesias (mesmo a mais recentes) perderão a sua sustentabilidade política e financeira. Talvez sejam estas as nuances que perpassam no pensamento dos líderes partidários regionais quando apelam à obtenção de consensos, e é por isso que estas palavras poderão constituir, mais do que o desafio de um sistema, um desafio ao sistema.
A todos Votos de um Santo Natal e Próspero 2005.
Postits (http://chaverde.blogspot.com/).
Sé, Angra do Heroísmo, 17 de Dezembro de 2004
Guilherme Tavares Marinho
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