domingo, outubro 14, 2007

O SUSPEITO DO COSTUME

O Senhor Presidente da República veio aos Açores um ano e meio depois de ter iniciado o seu mandato (e já disse que cá quer voltar, antes de 2011, para conhecer as restantes, o que não está nada mau) anunciando que a visita que aos Açores tinha como objectivo conhecer a "nova realidade" do arquipélago e o "esforço feito por todos os açorianos" na melhoria das condições de vida, o que é para nós uma afirmação cristalina de aval às mudanças que o arquipélago sofreu desde que abandonou o poder como Primeiro-Ministro nos idos de 1995, a fazer pensar aqueles que tanto gostam de beber no cantil presidencial...
No entanto, os nobres propósitos de (re)conhecimento do Senhor Presidente, integrando, inclusive, esta visita no roteiro da ciência e do mar, cedo se secundaram. O Senhor Presidente sabia onde estava e ao que vinha. Sabia quem o ouviria, os de cá e os de lá (Madeira e Continente), e sabia que esta constituía uma oportunidade única para enquadrar “presidencialmente” os futuros debates autonómicos, pois não deixam de chegar a Belém, via Madre de Deus, os mediatizados contentamentos dos Senhores Deputados Regionais sobre os inovadores avanços autonómicos que, dizem, o anteprojecto encerra, nem são esquecidas as estrídulas ameaças madeirenses para a revisão constitucional de 2009. Sabedor disso tudo, e, certamente, de muito mais, o Senhor Presidente, magistrado de influências e magister (professor) de palavras, usou da máxima que tanto poder lhe tem dado: Os discursos do Presidente são importantes!
Nem querendo alegar desconhecimento constitucional confirmou o Senhor Presidente, no seu discurso (*) na casa mãe da Autonomia, que: "...Não compete, naturalmente, ao Presidente da República desenhar a arquitectura constitucional do sistema autonómico. O leque de poderes atribuído às Regiões Autónomas, seja na versão originária seja nas suas subsequentes revisões, é matéria da competência exclusiva da Assembleia da República…”. Contudo, na hora da verdade, o quadro mental deste nosso “suspeito do costume” falou mais alto e disse (sublinhados nossos): "...deveríamos, nem que fosse por breves instantes, saudar aqueles que, através da fórmula do Estado unitário regional, souberam encontrar um saudável equilíbrio entre dois princípios estruturantes da República Portuguesa..." ou "...os grandes desafios que se colocam ao futuro das autonomias passam, hoje, mais pelas políticas adoptadas do que pela consagração formal de novas competências e de novos poderes...", e ainda, "...Desejo (...) reiterar a minha confiança nos Representantes da República para as Regiões Autónomas, que aqui saúdo, fazendo votos de que os mesmos disponham de um estatuto adequado ao cabal exercício das suas competências de representação da soberania da República...", finalmente, "...Estou certo de que os Deputados desta Assembleia têm o sentido de responsabilidade necessário para assegurar um relacionamento saudável com as autoridades da República..."
Perfeito e inspirador para aqueles que vão querer glosar, daqui a poucos meses, este "legado autonómico" do Presidente sobre a Proposta de Reforma do Estatuto Político-Administrativo da Região. Não acreditam? Pois, cá os espero...

(*) http://www.presidencia.pt/?idc=22&idi=9447

Sé, 09 de Outubro de 2007